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R.E.M. e os 30 anos de Monster: Um disco à frente de seu tempo

Em 2024, o álbum Monster, da banda R.E.M., celebra seu 30º aniversário. Lançado em setembro de 1994, o disco é frequentemente visto como um ponto de inflexão na carreira da banda. Após o sucesso estrondoso de Out of Time (1991) e Automatic for the People (1992), que renderam ao grupo uma popularidade global, Monster foi uma mudança sonora que surpreendeu tanto os fãs quanto a crítica. Com guitarras distorcidas e um som mais sujo, o álbum mergulhou no rock alternativo de uma forma inesperada, contrastando com a sutileza acústica dos trabalhos anteriores.

Mas afinal, como Monster se posiciona 30 anos após seu lançamento? Foi um disco subestimado ou incompreendido? Ou será que ele ocupa um lugar de destaque no coração dos fãs? Para responder a essas perguntas, é preciso revisitar a sonoridade, o contexto e o impacto cultural do álbum.

R.E.M. já era uma das bandas mais influentes da cena alternativa dos anos 80 e 90, com uma sonoridade marcada por melodias suaves e letras introspectivas. Com o sucesso mainstream de Losing My Religion e Everybody Hurts, a expectativa era que a banda continuasse nesse caminho. No entanto, Monster foi uma surpresa para muitos. Ao invés de melodias acústicas e baladas emocionais, o álbum trouxe um som mais cru e distorcido, inspirado pelo glam rock e pelo grunge, que dominava as paradas naquele momento.

Em entrevistas na época, o vocalista Michael Stipe revelou que a mudança de som foi uma decisão consciente. “Queríamos fazer algo diferente, algo que fosse um reflexo da época, mas que também nos permitisse explorar outras formas de expressão“, disse Stipe em uma entrevista à Rolling Stone em 1994. De fato, o álbum soa como uma tentativa deliberada de romper com o passado e abraçar uma nova estética musical. As faixas são sujas, as guitarras são altas e os vocais de Stipe flertam com uma postura mais provocadora e, por vezes, misteriosa.

A produção de Monster foi liderada por Scott Litt, colaborador de longa data da banda, que ajudou a criar o som mais pesado e mais orientado pela guitarra que permeia o disco. As influências são diversas: do glam rock de David Bowie à rebeldia do punk e a estética do grunge, que dominava a cultura pop no início dos anos 90.

Faixas como What’s the Frequency, Kenneth? e Crush with Eyeliner apresentam guitarras distorcidas, quase cacofônicas, que criam uma atmosfera densa e por vezes desconcertante. A primeira faixa, em especial, tornou-se um dos maiores hits da banda, misturando uma energia contagiante com a tradicional ambiguidade lírica de Stipe. A canção foi inspirada em um incidente bizarro em que o jornalista Dan Rather foi atacado nas ruas de Nova York por um homem que repetia a pergunta “What’s the frequency, Kenneth?”. Esse tipo de referência pop inusitada é uma marca registrada de Stipe, que muitas vezes preferia deixar as interpretações de suas letras em aberto.

Outra faixa de destaque é Star 69, uma das mais pesadas do disco, com um riff pulsante e uma letra que explora paranoia e perseguição. Já Tongue é uma balada sensual e irônica, com Stipe experimentando falsetes, criando um contraste intrigante com o resto do álbum.

Lançado em meio ao auge do grunge e da cultura alternativa, Monster foi recebido com expectativas mistas. A crítica estava dividida: alguns elogiaram a coragem da banda em explorar novas direções, enquanto outros lamentaram a perda da suavidade melódica que caracterizava seus álbuns anteriores. No entanto, comercialmente, o álbum foi um sucesso. Estreou no topo das paradas em vários países e vendeu mais de 9 milhões de cópias ao redor do mundo.

Parte do apelo de Monster foi sua capacidade de refletir o espírito inquieto e sombrio dos anos 90. Em uma década marcada por descontentamento juvenil e crises de identidade cultural, o som mais pesado e as letras introspectivas da banda capturaram o momento de uma geração em transição. O álbum também foi uma resposta indireta ao cenário musical, que estava se transformando rapidamente, com bandas como Nirvana e Pearl Jam dominando o mainstream.

Para promover Monster, a banda embarcou em sua primeira grande turnê mundial em seis anos. No entanto, a Monster Tour ficou marcada por uma série de desafios pessoais e profissionais. O baterista Bill Berry sofreu um aneurisma cerebral durante um show na Suíça, o que forçou a banda a interromper a turnê. Esse foi o primeiro de uma série de problemas de saúde que atingiram a banda durante a excursão, afetando profundamente os membros e o futuro da R.E.M.

A turnê de Monster também foi a última com a formação original da banda, antes de Berry deixar o grupo em 1997. Esse fato, combinado com as dificuldades enfrentadas na estrada, adicionou um peso emocional ao álbum, fazendo com que Monster seja lembrado não apenas por sua música, mas também pelos desafios que a banda enfrentou durante esse período.

Monster: Um disco subestimado?

Apesar de seu sucesso comercial e de seu impacto na época, Monster é frequentemente visto como um álbum subestimado dentro do catálogo da R.E.M. Muitos fãs consideram o disco uma obra-prima incompreendida, que só ganhou reconhecimento com o passar do tempo. Enquanto álbuns como Automatic for the People continuam a ser celebrados pela crítica e pelo público, Monster sempre teve uma relação mais complicada com os ouvintes.

Para alguns, o álbum representa um desvio desconfortável do som pelo qual a banda era conhecida. No entanto, para outros, Monster é um testemunho da capacidade da R.E.M. de se reinventar e de explorar novas fronteiras sonoras. A reedição do álbum em 2019, por ocasião de seu 25º aniversário, ajudou a reavivar o interesse pelo disco, trazendo uma nova geração de ouvintes para redescobrir suas camadas e nuances.

Três décadas após seu lançamento, Monster continua a ser um álbum polarizador, mas sua relevância nunca foi tão clara. Em um cenário musical atual, onde a experimentação e a fusão de gêneros são cada vez mais comuns, o álbum pode ser visto como um precursor dessas tendências. Sua mistura de rock alternativo, glam, grunge e pop não apenas capturou o espírito de sua época, mas também abriu caminho para a evolução da música nos anos seguintes.

Além disso, o disco tem um lugar especial entre os fãs mais fiéis da banda. Embora não seja o favorito absoluto de todos, ele ocupa uma posição importante na discografia da R.E.M., sendo celebrado por sua ousadia e por ter mostrado um lado mais agressivo e visceral do grupo.

Monster é, sem dúvida, um dos álbuns mais intrigantes da carreira da R.E.M. Ao celebrar 30 anos de sua existência, é um bom momento para revisitá-lo com novos ouvidos e uma compreensão mais ampla de seu contexto. O álbum pode ter sido visto como um desvio inesperado na época, mas hoje é reconhecido como uma peça essencial no legado da banda. Monster é um lembrete de que a verdadeira arte muitas vezes desafia as expectativas e se recusa a se encaixar em moldes predefinidos – uma lição que a R.E.M. nos ensinou com maestria.

Autor

2 respostas para “R.E.M. e os 30 anos de Monster: Um disco à frente de seu tempo”

  1. Avatar de Daniel
    Daniel

    Uma adição ao seu texto bem bacanudo, vale lembrar a participação especial do Thruston Moore do Sonic Youth no disco.

    1. Avatar de Luis Fernando Brod
      Luis Fernando Brod

      Bem lembrado, Daniel. Valeu por compartilhar.

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