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Gerson Conrad e Marcos Delfino – Tributo 50 anos Secos & Molhados – Uma noite mágica

“Os ventos do norte não movem moinhos”, verso marcante da canção “Sangue Latino” que menciona o fator histórico dos países dominantes que viviam da exploração da mão de obra escrava, não “moviam os moinhos” de fato, não faziam o trabalho manual. A coroa portuguesa e espanhola apenas recebiam as riquezas dos enormes saques. “Os ventos do norte” são uma referência aos países do hemisfério norte, grande elemento da nossa histórica que a canção marca muito forte junto com sua bela melodia. Tratando-se de ventos serem capazes de mover algo, há outro fator muito grande que eles também não são capazes, é mover o esquecimento do longo tempo percorrido de uma determinada obra, ainda mais quando se fala de um álbum como a de estreia de uma das bandas mais importantes e marcantes da música brasileira como Secos e Molhados, ele soa tão atual como da época lançada, não tem como esquecer deste disco, seria um verdadeiro crime contra a nossa cultura.





Formado pelos integrantes João Ricardo, Ney Matogrosso e Gerson Conrad, como o próprio guitarrista e violonista falou em nosso bate papo realizado em duas oportunidades, uma no meu canal Na Ponta da Agulha e outra na colab entre o meu canal, a “Disconecta” e o nosso selo ( formado por Marcelo Scherer, Vicente Toniolo e eu). Eles eram marinheiros de primeira viagem. É impressionante como três músicos sem terem lançado algum trabalho, tão jovens, conseguiram atingir um nível de maturidade musical tão elevado, para uma estréia, atingindo a sociedade, moda, comércio, política, ditadura e comportamento.





É perfeito do início ao fim. As canções elas casam umas com as outras, quase formando uma ópera-rock. Ao mesmo tempo, elas tem suas particularidades, umas diferentes das outras, É impossível mencionar um determinado ritmo, cada vez que ouve ele, lhe soa um som ou estilo diferente, tem praticamente de tudo nele. Um álbum que menciona de todos os elementos principais de nosso convívio como amor, respeito, preconceito, medo, diversão, brincadeiras ( o que você me diz de “O Vira”?) política como a irretocável “Rosas de Hiroshima”, entre tantas outras que caberia falar em detalhes em outro conteúdo, recomendo fortemente você que já conhece, ouve novamente na íntegra, sem playlists, por favor!, ouve na ordem, e principalmente você que está lendo aqui, escute com atenção, escute o Tio Cássio aqui, seus ouvidos irão agradecer enormemente pela grandiosidade musical que estará fazendo para si mesmo.

O Tempo Passou..

Exatamente 50 anos se passaram, milhares de pessoas no Brasil e no mundo foram impactados pela grandeza da obra de 1973, entre tantos, surge na metrópole de Porto Alegre, precisamente na cidade de Gravataí(RS), um cantor chamado Marcos Delfino, com mais de 20 anos de carreira, sua longa estrada musical passa pelos principais palcos do país, conquistando respeito e admiração por ninguém menos que o Sir. Ney Matogrosso, numa de suas performances no seu respeitável tributo ao Cazuza (confira no instagram do Marcos, tem performances incríveis de suas interpretações, e olha que sou um cara receoso para shows-tributo, para estar destacando o trabalho vindo de uma homenagem), isso se traduz em premiações como melhor intérprete em diversos festivas e a pré-indicação ao Grammy Latino com a sua ex-banda Sigma 7, como ele destacou em nossa live.

Como disse anteriormente, ele tem grande destaque pela sua voz versátil, dono de um alcance vocal que impressiona, cantando Cazuza e também canções do próprio Ney, chamou atenção nacionalmente, chegando aos olhos do Gerson Conrad, que acabou surgindo uma grande parceria que já rendeu frutos como a gravação da canção “Agora” e outras novidades que estão por vir.

Eis que acontece um anúncio inédito no Brasil, o tributo aos Secos e Molhados, homenageando os dois emblemáticos álbuns de estúdio que o trio clássico gravou, com o aval do Gerson Conrad, inclusive, tocar no show, foi o único em todo Brasil, show deste porte realizado.

Organizado e capitaneado pelo Marcos, foram meses de preparação, ensaios, repertório, produção, logística, promoção, foi quase um exército de um homem só, como diria Humberto Gessinger, fazer algo de forma independente deste porte no show business no Brasil é algo que tem ser tirado o chapeú.

O Grande Dia do Show

Chegou a grande data, 03 de novembro, as 20h da noite, clima agradável em Porto Alegre, no templo sagrado brasileiro da cultura e arte, Theatro São Pedro, semana intensa de aparições dos dois artistas nas mídias locais, além das nossas aqui, eis que chega o grande momento de poder assistir ao vivo um integrante de peso como Gerson que fez parte do cristal formado em três lados ( ney e joão), como ele descreve, quando uma destas partes se desloca, o cristal simplesmente quebra e não volta mais como era, exatamente como aconteceu no decorrer da história, para nós presentes neste dia, mistura de gerações, jovens de 15 a 80 anos ( sim, são jovens senhores!) quase que 100% nunca assistiram a banda ao vivo e boa parte nunca viram o Gerson ao vivo, eu sou um exemplo, mas, ele, volta e meia está em Porto Alegre fazendo shows em menores porte no qual ele adora muito, pela conexão próxima com público.

Esperava sold-out, pela importância que espetáculo representa, a casa não estava lotada mas tinha bom público, para a minha felicidade, consegui uma presença em frente ao palco, especificamente em frente ao violão onde o Gerson estaria logo mais posicionado para tocar o seu violão. Nos fundos dele, estava posicionados os músicos de apoio, compostos pelos competentes Jackson Duarte (bateria), Mick Oliveira (guitarra), Lula (teclado), Mauro Kupim (baixo), e Cibel Balsamo (flauta), que fariam toda a base sonora das canções do repertório, sob total fidelidade nos arranjos originais, exceto as canções de “El Rey”, ” Rosa de Hiroshima” e “Delírio”, ambos arranjos idealizados pelo Gerson, de todo o resto do repertório, selecionado e elaborado pelo cantor Marcos Delfino.

O espetáculo começa quase que pontualmente, nos moldes do comportamento britânico, com a canção ” Caixinha de Música do João” do álbum de 1974, a introdução jazzística no piano, em tom mais obscuro, prendendo totalmente a atenção de todos os presentes no theatro.

Abrindo a noite para o que viria seguinte com a pulsante ” Amor” do álbum de estréia, com a entrada do Marcos Delfino no palco, levantando a galera e intensificando as energias da apresentação com seus vocais potentes nesta canção que representa um tom bastante alto que até o próprio Ney tem dificuldade de atingir notas tão elevadas e a forma de cantar soa quase como um rap, por ser ligeira, o Marcos interpretou incrivelmente, não soando ou querer ser igual ao Ney, conseguiu integrar sua personalidade vocal.

Sim, estava visualmente caracterizado aos elementos teatrais que o vocalista original da banda utilizava, mas sem soar como “cover” como próprio Gerson falou nas entrevistas, que era um de seus maiores receios ao participar de um tributo á banda no qual foi inúmeras vezes convidado para participar e todas rejeitadas. A voz do Marcos soa muito parecido como a do Ney, mas, ao acompanhar o trabalho dele, é de sua total naturalidade a tonalidade aguda e doce de sua voz, não é absolutamente nada forçado por parte do Marcos, foram estes recursos que conquistaram o Gerson, que sentiu-se animado em fazer o show junto com ele.

Conhecia o trabalho do Marcos pela internet, nunca tinha visto ele ao vivo, faz frequentemente shows na região da capital gaúcha com seus tributo ao Cazuza e também ao David Bowie, me impressionei com suas apresentações, nada de querer ser igual ao artista homenageado, em meio á tantos manjados pelo Brasil e pelo mundo que muitas vezes cansa o admirador da música, por ser só mais um cover.

A noite seguiu com outro clássico ” Flores Astrais” o grande hit de 74, que ganhou clipe no Fantástico naquela época, cada nota da original muito bem tocada pela banda de apoio e o Marcos levando para cada ouvido presente onde e como deveria ser levada com a sua performance cada vez mais intensa, envolvente e emocionante, provocando imaginações em nossas mentes de como soaria ao vivo o Secos nos tempos áureos que lotavam ginásios como o do Maracanãzinho ( lembrando que ninguém fazia naquela época, a banda foi pioneira no show business no Brasil, tocar para multidões), escutem o álbum ao vivo registrado deste show mencionado, que foi lançado nos anos 80, o próprio Gerson produziu e nos detalhou em nossa live, percebe claramente a potência da banda, eram desconcertantes, tocavam diferente das versões de estúdio, simplesmente hipnotizantes.

O repertório é composto pelos dois álbuns, quase que na íntegra, mas, eles mexeram na ordem, variando entre os repertórios, que ligou muito bem, conectou o público, sem se importar de serem tocados exatamente em suas faixas, particularmente como admirador de ouvir discos na íntegra, seria espetácular, mas que não me prendeu atenção este fator, estava de olhar atento ao palco, cada instante musical provocada pelo Marcos e sua ótima banda.

A Grande Emoção

Grande momento acontece com o anúncio da entrada de Gerson, aplaudida calorosamente, tamanha emoção causada, que foram capazes de impactar lágrimas ao grande músico, que não conteve o sentimento de estar pisando no Theatro São Pedro, dividindo com jovens músicos ( como próprio Gerson os chama) levando e reverenciando sua obra, foi um dos principais momentos do show.

Os dois dividem os vocais, de forma visceral, como se tocassem há anos, fica muito claro a naturalidade e a vontade que eles se sentiam tocando juntos, o Marcos não ficou travado com a presença do fundador do Secos e Molhados, os anos de experiência falaram muito alto durante sua execução ao vivo neste instante histórico para a sua carreira e para sua vida, porque não?

“El Rey”, como antecipei aqui, foi uma versão diferente da original, combinando com elementos funkeados nos bons elementos da galera da Motown do final dos anos 60 para começo de 70, desvirtuando lindamente do padrão até então.

Grande momento acontece com o anúncio da entrada de Gerson, aplaudida calorosamente, tamanha emoção causada, que foram capazes de impactar lágrimas ao grande músico, que não conteve o sentimento de estar pisando no Theatro São Pedro, dividindo com jovens músicos ( como próprio Gerson os chama) levando e reverenciando sua obra, foi um dos principais momentos do show.

Os dois dividem os vocais, de forma visceral, como se tocassem há anos, fica muito claro a naturalidade e a vontade que eles se sentiam tocando juntos, o Marcos não ficou travado com a presença do fundador do Secos e Molhados, os anos de experiência falaram muito alto durante sua execução ao vivo neste instante histórico para a sua carreira e para sua vida, porque não?

“El Rey”, como antecipei aqui, foi uma versão diferente da original, combinando com elementos funkeados nos bons elementos da galera da Motown do final dos anos 60 para começo de 70, desvirtuando lindamente do padrão até então.

A emoção que já era grande, aumenta ainda mais com o maior clássico ” Sangue Latino” neste instante, os cantores moveram moinhos com seus ventos vocais carregados de alma musical, transcendo toda a pureza lírica e instrumental que a canção carrega que parece jamais ser vencida pelo tempo dela que foi composta, dividindo junto com a voz uníssona do público.

Vários clássicos sendo muito bem desfilados para a chegada da calada da noite com a outra versão diferenciada, e, esta, foi selecionado especialmente para a apresentação. ” Rosa de Hiroshima” devia ser tombada pelo patrimônio público, tamanho impacto social, cultural, musical e lírico em nossa história, poucos poemas musicados foram tão fortemente marcados ao nosso subconsciente quanto este clássico que foi incrivelmente composto pelo Gerson, pela história envolvente numa bela madrugada após a leitura de um dos livros de Vinícius de Moraes, essa história está em nossa live, e que gerou este belo fruto gravado no álbum de estréia.

Os rostos que presenciaram o Theatro, ouvia sussurros de cantos, pareciam sem acreditar que estava realmente acontecendo, feliz estes que acompanharam esta noite única, como eu, que pode virar uma turnê em 2024, pelos bastidores.

“Teias” e ” Estação” como mencionei, mostrou que o Gerson está em forma, ele nunca foi um cantor como Ney, seu forte é a guitarra/violão e as composições como sempre foi, um exímio compositor, mas, dentro de suas condições vocais, interpretou com emoção estas fortes baladas que carregam uma profundidade amorosa que as vezes soa como auto-biográfica, coisas que não é pra qualquer um escrever uma canção com esta densidade

Após o rock agitado ” Mulher Barriguda”, abre o bis para o momento que não era esperado, desfile de clássicos da carreira solo do Ney que o Marcos transmite ainda mais alcance vocal, sutileza, delicadeza nas notas como a provocante ” O Último Dia”, a balada ” Poema”, esta foi a mais cantada do público do repertório do Ney, não é pra menos, uma canção importantíssima por ser uma composição póstuma de Cazuza, “Balada do Louco”, a dançante ” Homem Com H”, e fechando a noite, com a volta do Gerson, essa jamais poderia faltar, seria um crime dos cantores se deixassem, ” O Vira”, com participação especial do gaiteiro Diego Dias, da banda Vera Loca, desfilando solos com sutileza, sem exageros, neste rock-frevo-forró-música portuguesa, que atravessou gerações de todas as idades, conquistando crianças, que era algo impensável pela banda em 1973.

Esperamos que este espetáculo possa ser levado para todo Brasil, uma abordagem fiel e respeitável com a presença de um dos músicos responsáveis pela obra, tem que ser vista para muito mais pessoas, algo desta magnitude não pode nunca ficar de fora. Foi uma noite que os ventos da boa música e da arte moveram moinhos. Provou mais uma vez que a obra do Secos sempre será atemporal.

Créditos das fotos do show: Ricardo Almeida/ imagem do Secos e Molhados: Fernando Seixas/O Cruzeiro/EM/D.A Press – 30/1/1974

SET LIST TRIBUTO SECOS & MOLHADOS – ESPECIAL 50 ANOS

01 – Caixinha de Música do João

02 – Amor

03 – Flores Astrais

04 – Tercer Mundo

05 – O Doce e o Amargo

06 – Fala

07 – Rondó do Capitão

08 – Medo Mulato

09 – O Hierofante

10 – El Rey ( entrada do Gérson)

11 – Sangue Latino

12 – Assim Assado

13 – Não, Não Digas Nada

14 – Patrão Nosso de Cada Dia

15 – Prece Cósmica

16 – Primavera nos Dentes

17 – Rosa de Hiroshima

18 – Delírio

19 – Teias

20 – Estação

21 – Mulher Barriguda

BLOCO BIS

22 – O Último Dia

23- Poema

24 – Balada do Louco

25 – Homem com H

26 – O Vira

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