O ano de 1978 pulsava com uma energia singular na cena musical britânica. O punk, que havia chacoalhado o mundo com sua irreverência, começava a mostrar novas facetas, enquanto o rock mais pesado também buscava seu caminho. Foi nesse cenário de efervescência que uma união inesperada, e por vezes esquecida, aconteceu, misturando a crueza do punk com a força bruta do rock de Lemmy Kilmister.
The Damned, uma das bandas que abriu caminho para o punk no Reino Unido, era conhecida por sua energia indomável e por uma certa rotatividade em sua formação. Em um desses momentos de busca por um novo baixista, surgiu a ideia de convidar Ian Fraser Kilmister, o lendário Lemmy. Ele já era uma figura conhecida, tendo deixado sua marca no Hawkwind e, mais recentemente, liderando sua própria máquina de rock and roll, o Motörhead.
A princípio, a imagem de Lemmy, com seu baixo Rickenbacker e sua postura de roqueiro experiente, ao lado de uma banda punk como The Damned, poderia parecer um tanto curiosa. No entanto, quem conhecia Lemmy sabia que ele era um músico que vivia sem amarras, sempre no limite, sem se prender a rótulos. Sua forma direta e sem rodeios de fazer música, afinal, tinha muito em comum com o espírito do punk.
Para aquele período específico, e talvez para evitar algumas questões contratuais, a banda decidiu se apresentar sob o nome The Doomed. Foi com essa nova identidade que Lemmy assumiu o baixo, trazendo consigo uma camada de peso e um ritmo que eram inconfundivelmente seus. As apresentações de The Doomed foram, sem dúvida, intensas e deixaram uma marca. O baixo de Lemmy, com suas linhas galopantes e distorcidas, injetou uma boa dose de Motörhead no som já potente de The Damned.
Essa combinação resultou em algo que soava ao mesmo tempo familiar e surpreendentemente novo. A velocidade e a agressividade típicas do punk de The Damned ganharam uma profundidade e uma pegada que só Lemmy poderia oferecer. Não era apenas punk; era um punk com uma robustez que parecia antecipar o que mais tarde seria conhecido como speed metal, um estilo que o próprio Motörhead ajudaria a moldar.
Os palcos onde The Doomed se apresentou foram testemunhas de uma verdadeira fusão de talentos. A presença de Lemmy, com seu microfone posicionado acima da cabeça e seu baixo pulsando, ao lado da energia e da anarquia de The Damned, criou um espetáculo que poucos tiveram a sorte de ver. Essas performances foram uma prova da versatilidade de Lemmy e da capacidade do punk de absorver e reinterpretar diferentes influências.
Ainda que tenha sido um capítulo breve, a passagem de Lemmy por The Doomed é um momento fascinante na história do rock. Ela nos mostra como, em momentos de necessidade e de pura experimentação, artistas de universos distintos podem se encontrar e criar algo verdadeiramente único. Aquela “dose de Motörhead” no punk de The Damned não foi apenas uma curiosidade; foi uma explosão de energia que capturou a urgência da época, deixando uma lembrança, mesmo que passageira, na memória de quem esteve lá.