A história de “Coming Up”, a faixa de Paul McCartney que conquistou John Lennon

Luis Fernando Brod
4 minutos de leitura
Paul McCartney. Foto: Reprodução.

Lançada em abril de 1980, a música “Coming Up”, de Paul McCartney, marcou uma inesperada reconexão criativa entre ex-Beatles.

Com melodias leves e pegada dançante, a faixa chamou a atenção de John Lennon, então afastado do estúdio.

À época, McCartney promovia o disco McCartney II, gravado de forma caseira com instrumentos e equipamentos analógicos. Mesmo distante do rock tradicional, a canção provocou Lennon o suficiente para que ele retomasse as gravações.

A admiração mútua entre Lennon e McCartney sempre os colocou como referências um para o outro, mesmo após o fim da banda. Embora tenham trocado críticas públicas durante os anos 1970, mantinham uma escuta atenta às obras solo.

Segundo McCartney, Lennon ouviu “Coming Up” e percebeu que o parceiro seguia em atividade e com novas ideias.

Em entrevista à Rolling Stone, Paul comentou o episódio com um certo humor:

“Soube por um amigo que gravava com John que ele às vezes ficava preguiçoso. Mas quando ouvia algo meu, pensava: ‘Poxa, o Paul está se mexendo!’”

Lennon, por sua vez, confirmou a impressão em uma conversa com o jornalista David Sheff, em 1980. Ao ser questionado sobre o disco de Paul, inicialmente dissera achá-lo “triste”.

Depois, corrigiu o comentário:

“Não tinha ouvido o disco inteiro. Só conhecia ‘Coming Up’, que achei um bom trabalho.”

A sinceridade desarmada de Lennon chamou atenção pela ausência de rivalidade, algo incomum nas declarações dos dois.

Gravada com vocais distorcidos, sintetizadores Lo-Fi e sobreposição de instrumentos, “Coming Up” é um exemplo claro da guinada experimental de McCartney.

A faixa tem influência do new wave e da eletrônica que ganhavam espaço no final da década de 1970. No clipe, McCartney aparece multiplicado, interpretando todos os músicos de uma banda fictícia, com figurinos variados.

A estética bricabraque do vídeo também marcou o início de uma fase visualmente mais descontraída do artista. Apesar de ter sido composta muito depois da separação dos Beatles, “Coming Up” carrega elementos que a tornariam compatível com a fase final do grupo.

A levada otimista, os vocais em camadas e a estrutura pop remetem à energia colaborativa dos tempos de estúdio em Abbey Road.

Ainda que jamais tenha sido pensada para os Beatles, é possível imaginar a canção no repertório da banda, entre faixas como “Getting Better” ou “Hello Goodbye”.

“Coming Up” chegou ao primeiro lugar das paradas nos Estados Unidos em junho de 1980, impulsionada por uma versão ao vivo lançada como lado B. A gravação ao vivo, feita com a banda Wings, foi a preferida pelas rádios norte-americanas, que a consideraram mais vibrante.

No Reino Unido, a versão de estúdio liderou as paradas, marcando a volta de McCartney ao topo como artista solo. A resposta do público consolidou o momento criativo do ex-Beatle, às vésperas de uma década cheia de transformações.

Pouco tempo depois de se declarar impressionado com “Coming Up”, John Lennon voltou ao estúdio ao lado de Yoko Ono. O resultado foi Double Fantasy, lançado em novembro de 1980, apenas três semanas antes de seu assassinato.

Em entrevistas posteriores, Yoko também comentou que a canção de Paul havia reacendido o desejo de John em compor novamente. A faixa, assim, ocupou um papel discreto, mas decisivo, nos últimos passos criativos de Lennon.

Mais de quarenta anos após seu lançamento, “Coming Up” segue como uma das canções mais comentadas de McCartney II.

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