A versão de “Definitely Maybe” que catapultou o Oasis ao estrelato em 1994 não foi a primeira tentativa do álbum. Antes do lançamento oficial, a banda quase completou uma série de gravações que acabaram sendo abandonadas por não transmitirem a “vibe” desejada. Agora, o produtor original, Dave Batchelor, falou sobre os detalhes sobre essas sessões inéditas em entrevista.
As gravações, realizadas no Monnow Valley Studio, em Gales, foram conduzidas por Batchelor, um veterano da cena musical escocesa, que já havia trabalhado com bandas como The Sensational Alex Harvey Band (SAHB). Ele conheceu Noel Gallagher nos anos 90, quando ambos trabalhavam como técnicos de som em turnês. “Eu conheci Noel enquanto estávamos em turnê com o Inspiral Carpets”, conta Batchelor em entrevista ao Ultimate Classic Rock. “Ele era o técnico de guitarra e eu estava fazendo o som da frente de palco. Nos demos bem logo de cara, e ele me mostrou as demos da banda dele e de Liam. Eu fiquei impressionado. Mesmo naquela fase inicial, já dava para perceber que tinha algo especial ali.”
Na época, o Oasis ainda não tinha contrato com gravadora, mas Noel prometeu que, quando o acordo fosse fechado, Batchelor seria o produtor. E ele cumpriu a promessa, mas a parceria no estúdio não saiu como planejado.
Expectativa e realidade nas primeiras gravações do Oasis
Batchelor estava entusiasmado em trabalhar com o Oasis, especialmente após anos longe das gravações em estúdio. “Eu vinha de uma longa experiência produzindo bandas durante o punk, mas estava me cansando da falta de substância de muitas delas. O Oasis era diferente; havia algo autêntico ali”, disse.
As sessões de gravação começaram em Monnow Valley, um estúdio residencial isolado, longe do cenário urbano. Batchelor elogiou o ambiente, mas reconheceu que a banda estava fora de sua zona de conforto. “Noel queria capturar a energia ao vivo da banda, algo que eu entendi bem. Eu usei essa abordagem quando produzi o primeiro álbum do SAHB. Mas naquela época, os músicos já eram experientes, o que não era o caso do Oasis. Achei melhor manter os instrumentos isolados, como foi feito em álbuns icônicos, como Never Mind the Bollocks, dos Sex Pistols”, relembra.
No entanto, durante as gravações, surgiram desafios. Batchelor percebeu que a falta de experiência da banda, especialmente do baterista Tony Carroll, atrapalhou o processo. “Mudanças nos arranjos costumam afetar mais os bateristas, e com a inexperiência de Carroll, ele tinha dificuldades em manter o ritmo”, explica o produtor. Ele também notou que a impaciência dos irmãos Gallagher em começar a gravar o álbum não ajudou no clima do estúdio.
A tensão entre a sanidade e a loucura criativa
Enquanto Batchelor tentava manter o controle e a organização das gravações, Noel Gallagher começou a sentir que os métodos tradicionais do produtor não se alinhavam com sua visão. Em uma entrevista à revista Mojo, Noel relembrou: “Quando chegou a hora de mixar, eu queria fazer algo diferente, aumentar a compressão até os alto-falantes explodirem. Mas o Dave dizia: ‘Não, filho, é assim que fizemos nos velhos tempos’. E aí pensei, ou seguimos a sanidade dele ou minha loucura. E como eu estava no comando, tive que dizer: ‘Desculpa, amigo, você vai ter que ir embora’.”
Batchelor rebateu a citação de Noel, sugerindo que o guitarrista pode ter exagerado para efeito dramático, e garantiu que nunca teria falado de forma tão condescendente. “Não estávamos na mesma ‘vibe’ recreativa da banda, por assim dizer. Havia tensão nesse aspecto, especialmente com visitas ao estúdio que se estendiam noite adentro, o que dificultava minha concentração e descanso”, revela.
Sessões abandonadas e o sucesso do álbum final
Com o avanço das sessões, Batchelor começou a sentir que o projeto estava perdendo força. Embora estivesse confiante na qualidade das faixas gravadas e no desempenho vocal de Liam Gallagher, a banda não compartilhava a mesma sensação. Após a saída de Batchelor, as gravações de Monnow Valley foram abandonadas, e o produtor refletiu sobre o que poderia ter sido.
“Eu acho que tivemos ótimas performances. Mas, no final das contas, a banda sentiu que aquilo não estava funcionando. Em retrospectiva, talvez eu não fosse a pessoa ideal para o projeto. O Oasis tinha uma atitude diferente e talvez precisasse de alguém que estivesse mais sintonizado com isso”, admite Batchelor.
Apesar da ruptura, Batchelor acredita que as sessões em Monnow Valley ajudaram a banda a encontrar o caminho para o sucesso que veio com Definitely Maybe. “Eu diria que essas gravações foram um aprendizado importante para eles. Acredito que sem aquela experiência inicial, o álbum não teria se tornado o clássico que é.”
Reflexão e reconciliação
Após sua saída, Batchelor encontrou novamente o Oasis em um festival no Reino Unido, quando eles já estavam a caminho do sucesso global. Ele conta que a conversa com Noel foi amigável, mas admite que o afastamento do projeto foi difícil de superar. “Eu confesso que não mergulhei em Definitely Maybe logo de cara. Ainda estava machucado. Mas com o tempo, consegui apreciar o trabalho e entender como ele capturou a essência da banda.”
Anos depois, com o lançamento de edições comemorativas do álbum, Batchelor se sente mais inclinado a revisitar aquelas sessões. “Talvez seja a hora de fazer algumas comparações. No final, todas as peças se encaixaram, e eles criaram algo atemporal. O Oasis tinha talento, paixão e atitude de sobra. Mas, como sempre na música, um pouco de sorte e timing também foram cruciais para que Definitely Maybe se tornasse o que é.”
Apesar das tensões e frustrações, Batchelor vê as sessões abandonadas como um marco necessário no desenvolvimento do Oasis. “Acho que foi um processo de amadurecimento para eles. Eles precisavam daquele tempo para se ajustar e encontrar sua sonoridade. No final, todos saímos ganhando.”
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