Lançado em janeiro de 1975, “Modern Times” marcou uma virada decisiva na carreira do cantor escocês Al Stewart. Até então reconhecido por suas letras confessionais e pela atuação discreta no circuito folk britânico, Stewart começava a moldar ali um estilo que mesclava narrativa histórica, arranjos sofisticados e uma sonoridade que flertava com o soft rock. Meio século depois, o álbum permanece como uma peça-chave para compreender a transição entre o folk da virada dos anos 60 e a sofisticação pop que dominaria boa parte da década de 70.
Gravado no Abbey Road Studios, em Londres, sob produção de Alan Parsons, “Modern Times” é o sexto disco da carreira de Stewart. Ele sucede “Past, Present and Future” (1973), álbum que introduziu seu interesse por temas históricos, abandonando o lirismo mais pessoal das primeiras composições. Mas é em “Modern Times” que o cantor consolida uma abordagem narrativa com vocabulário rico e personagens que atravessam séculos, inspirados por guerras, política, arte e literatura.
O disco contou com músicos como Tim Renwick (guitarra), Peter Wood (teclados) e Bruce Thomas (baixo), que mais tarde integraria o The Attractions, banda de apoio de Elvis Costello. Essa formação ajudou a conferir à obra uma sonoridade mais coesa e sofisticada, com destaque para os arranjos de cordas e teclados que permeiam várias faixas.
“Modern Times” inicia com “Carol”, uma canção que ainda remete ao Stewart dos primeiros discos, com um tom mais introspectivo e romântico. Mas é a partir de faixas como “Sirens of Titan” e “Apple Cider Re-Constitution” que o álbum começa a revelar sua intenção de unir literatura, política e história com melodias bem resolvidas e instrumentação apurada.
A faixa-título, com seus quase nove minutos, é uma espécie de resumo das ambições de Stewart naquela fase. Inspirada livremente no romance homônimo de Charlie Chaplin, a música mistura referências à Segunda Guerra Mundial, à guerra civil espanhola e à atmosfera política da década de 1930, tudo isso embalado por uma melodia que cresce em camadas, guiada pelos teclados de Peter Wood e por uma orquestração sutil.

Vale notar que a faixa também marca a colaboração inicial entre Al Stewart e Alan Parsons, então engenheiro de som já conhecido por seu trabalho com Pink Floyd e The Beatles. Parsons imprime ao disco uma clareza técnica que seria ainda mais explorada no álbum seguinte, “Year of the Cat” (1976), seu maior sucesso comercial.
O estilo de “Modern Times” pode ser classificado como uma combinação de folk rock britânico com elementos de pop sinfônico. Há uma preocupação notável com as texturas sonoras, os arranjos são meticulosos, e a produção evita excessos. Em vez de se apoiar em refrões fáceis ou estruturas previsíveis, Stewart prefere explorar dinâmicas, climas e sequências narrativas que convidam à escuta atenta.
A faixa “Not the One” exemplifica bem essa estética: começa de forma contida, com violão e voz, e vai crescendo em camadas sutis até atingir um clímax instrumental que se desfaz rapidamente. Já “Next Time” traz um arranjo mais pop, com presença marcante do piano e uma letra mais direta.
A capa original de “Modern Times” apresenta um Rolls-Royce em frente a uma mansão britânica, com o fotógrafo e cineasta Jimmy Page (não o guitarrista do Led Zeppelin) posando ao lado de uma modelo. Essa imagem foi posteriormente alterada nas versões norte-americanas por razões contratuais, mas tornou-se uma das capas mais comentadas da discografia de Stewart.
Curiosamente, o álbum foi banido temporariamente em alguns países do Leste Europeu, durante o auge da Guerra Fria. As referências a eventos históricos e a figuras da política ocidental foram vistas como subversivas em certos contextos. Nada que impedisse o crescimento de sua base de fãs nos Estados Unidos, onde Stewart já era ouvido com interesse por um público universitário em busca de letras mais elaboradas.
Apesar de não ter alcançado o mesmo sucesso comercial de “Year of the Cat”, “Modern Times” pavimentou o caminho para que Al Stewart se consolidasse como um contador de histórias no formato canção. Artistas como Colin Meloy (do The Decemberists), Belle and Sebastian e até mesmo Neil Hannon (do The Divine Comedy) já citaram Stewart como influência, especialmente por sua capacidade de misturar temas eruditos com arranjos acessíveis.
Além disso, o disco se tornou uma referência cult entre fãs de folk britânico e colecionadores de vinil. A edição original é hoje considerada item valioso, especialmente na versão com a capa inglesa. Em 2007, uma reedição em CD trouxe faixas bônus e notas de encarte assinadas pelo próprio Stewart, que relembrou o período de gravação como um dos mais livres e produtivos de sua carreira.
“Modern Times” é um álbum que exige atenção, mas recompensa com composições cuidadosas e letras que estimulam a curiosidade histórica. Meio século depois de seu lançamento, continua sendo um retrato de um artista em transição, buscando equilíbrio entre erudição, crítica social e melodia. Para quem deseja entender como o folk britânico dialogou com a sofisticação pop dos anos 70, este disco é uma peça essencial.