Como começar esta coluna é um verdadeiro desafio, já que eu preciso falar que a banda The Bulho tinha em sua formação um dos caras mais incríveis que eu já conheci neste plano: meu irmão de vida Beto de Bortoli.
Beto era uma dessas figuras que emanavam carisma e carinho por onde passava. Nunca vi nem ouvi nada nem ninguém falar uma palavra sequer dele a não ser carinho, respeito, amizade e amor. Beto era isso, um ser de luz que passou por nosso planeta e tive a sorte de conviver com ele.
Além de tudo, ele era um músico de alto gabarito, e um compositor de mão cheia. E eu já confessei isso mais de uma vez, se não fosse por ele é bem provável que hoje eu não seria baixista. Ele foi meu primeiro ídolo, o cara que eu me espelhei. E ele sempre foi generoso. Foi ele também o responsável por me fazer gostar de The Beatles, numa fase em que eu (ainda) era metaleiro. Entre outras coisas.
Beto partiu no começo deste ano, ele havia descoberto um câncer e ele já estava em estágio bem avançado. Perdi um de meus amigos mais antigos, um cara que era referência de vida pra mim. Mas, mesmo antes de partir, ele demonstrou a sua generosidade. Foi ele quem me convidou para entrar em sua banda mais antiga, a Jardim Elétrico. E ainda teve tempo, antes de descobrir a doença, de nos deixar um EP de uma de suas bandas, a The Bulho (eu acho esse nome genial).
Em um texto em seu Instagram, Matheus, o guitarrista da banda, faz um relato emocionante sobre o lançamento e a forma como ele foi produzido:
“Nunca imaginamos lançar um disco póstumo.
Mas a vida tomou um rumo inesperado.
Esse era pra ser apenas o nosso primeiro EP — uma celebração, um registro das músicas que criamos e tocamos juntos.
Hoje, lançamos Do Outro Lado do Mundo, o EP de estreia da The Bulho, feito com e por Beto de Bortoli — nosso vocalista, guitarrista, amigo e inspiração, que nos deixou no início deste ano.
São cinco faixas autorais de rock brasileiro que misturam amor, solidão e poesia, preservando a voz marcante do Beto — gravada entre salas improvisadas, madrugadas de ensaio e a vontade sincera de contar a nossa história.
Tudo começou em um estúdio improvisado, na casa do Bruno, foi lá que nasceu a primeira música que gravamos juntos.
Lembro como se fosse hoje: silêncio no estúdio, o Betão sozinho com o microfone, e a gente ouvindo a voz dele isolada pela primeira vez.
Arrepia só de lembrar.
Depois disso, ficou claro: a gente precisava registrar tudo.
Durante anos — entre pausas, reencontros e muitos rascunhos — fomos gravando como podíamos: em casa, dividindo microfones, trocando mensagens de madrugada, testando arranjos.
E o Beto, sempre presente, sempre atento, acompanhou cada mixagem, cada detalhe, nas três primeiras faixas finalizadas.
Quando ele disse que estavam prontas, a gente sabia que tinha algo verdadeiro nas mãos.
Depois que ele partiu, tomamos a decisão de seguir — com responsabilidade e carinho.
Finalizamos o EP com as vozes que ele já havia gravado. E, em alguns trechos, até mesmo com ajuda de inteligência artificial, pra recuperar gravações antigas que ele mesmo havia feito em casa, anos atrás.
Hoje, ouvindo as músicas finalizadas, com um misto de saudade e gratidão, tenho a sensação de ser abraçado.
Um abraço em forma de música.
Na verdade, é mais do que música:
é memória, é presença, é uma homenagem viva.
Feito por nós.
Por ele.
Com verdade.
Com alma.
Pra nós, é a prova de que a presença do Beto continua — viva, forte, pulsante — do outro lado do mundo, mas sempre aqui.”
Obrigado Beto, por tudo! Um dia a gente ainda vai se encontrar e por nosso papo em dia, quem sabe fazer um som pro pessoal. Te amamos!