S.G. Goodman aprofunda suas raízes em “Planting by the Signs”

Luis Fernando Brod
6 minutos de leitura
S.G. Goodman - Planting by the signs

“Planting by the Signs” confirma S.G. Goodman como uma das vozes mais consistentes e pessoais da música americana contemporânea. Assim como no disco anterior, ela parte de um território enraizado no folk, no country e no southern rock, mas amplia o alcance emocional e narrativo a cada faixa. É um álbum que não tenta reinventar tradições, mas as trata com intimidade e consciência, como quem entende de onde vem e para onde quer ir.

S.G. Goodman vem do oeste do Kentucky, uma região que atravessa todo o disco não apenas como cenário, mas como forma de pensar o mundo. Suas canções carregam o peso do lugar, da memória e das relações comunitárias, mas nunca soam presas ao passado. Pelo contrário: há uma tensão constante entre herança e deslocamento, entre permanecer e partir. Esse conflito silencioso dá ao álbum uma força particular, tornando-o profundamente humano e fácil de reconhecer, mesmo para quem nunca pisou no sul dos Estados Unidos.

Musicalmente, “Planting by the Signs” é mais expansivo do que seus trabalhos anteriores. As guitarras aparecem com mais corpo, às vezes ásperas, às vezes melódicas, enquanto a base rítmica sustenta um clima que oscila entre contemplação e urgência. Há ecos de country rock setentista, folk elétrico e até momentos de soul discreto, sempre colocados a serviço das canções, nunca como “exercício” de estilo. O disco cresce aos poucos, revelando suas camadas conforme o ouvinte se entrega à escuta.

A voz de Goodman é um dos grandes centros de gravidade do álbum. Grave, firme e carregada de emoção contida, ela nunca dramatiza além da conta. Existe uma honestidade crua na maneira como ela canta, como se cada palavra tivesse sido testada antes de ser dita. Suas letras falam de fé, amor, perda, pertencimento e da passagem do tempo, mas sempre a partir de imagens concretas, pequenos gestos e situações cotidianas. É nesse detalhe que o disco se fortalece.

Faixas como “Satellite” e “I Can See The Devil” mostram sua habilidade em transformar observações simples em reflexões amplas, enquanto outras canções se apoiam mais no clima e na repetição para criar um estado emocional específico. Nada soa apressado. Assim como no disco de Ryan Davis, há aqui um respeito pelo tempo da música, pela respiração entre os versos, pelo silêncio que também comunica.

A capa de Planting by the Signs funciona quase como uma extensão silenciosa das canções do disco. À primeira vista, ela remete a um universo rural, simples, ligado à terra e aos ciclos naturais, mas quanto mais se observa, mais claro fica que não se trata apenas de uma imagem bucólica. Ela carrega a mesma tensão que atravessa o álbum inteiro: tradição como abrigo e, ao mesmo tempo, como algo que exige escolhas difíceis.

O título já oferece a chave de leitura. “Planting by the signs” é uma prática antiga do sul dos Estados Unidos, baseada na ideia de plantar e colher de acordo com os ciclos da lua, das estações e de certos sinais naturais. Mais do que uma técnica agrícola, isso carrega uma visão de mundo — a confiança no tempo, na observação paciente e no conhecimento passado de geração em geração. A capa traduz visualmente essa filosofia: não há pressa, não há espetáculo, apenas o peso simbólico de algo que cresce lentamente.

A imagem sugere enraizamento, mas não conforto absoluto. Há uma certa austeridade, quase uma rigidez, que dialoga com o tom das músicas. Assim como as letras de S.G. Goodman, a capa não idealiza o campo nem romantiza a vida rural. Ela aponta para o trabalho, para o esforço repetido, para a noção de que viver de acordo com esses “sinais” exige fé, resistência e aceitação da incerteza. Plantar não garante colheita — apenas esperança.

“Planting by the Signs” é um álbum que pede escuta atenta, mas não exige esforço artificial. Ele se revela naturalmente, criando uma conexão quase física com quem ouve. Existe algo de reconfortante e, ao mesmo tempo, inquietante nesse equilíbrio entre tradição e inquietação pessoal. Goodman não oferece respostas fáceis, mas compartilha dúvidas e intuições com uma clareza rara.

Em um ano marcado por lançamentos que disputam impacto imediato, este é outro disco se destaca pela solidez e pela coerência artística. Não há excessos nem concessões evidentes. Tudo parece colocado no lugar certo, com intenção e sensibilidade. “Planting by the Signs” não é apenas mais um bom disco de 2025 — é um trabalho que reafirma S.G. Goodman como uma compositora que entende o poder das raízes, mas também sabe que crescer implica risco.

Assim como acontece com “New Threats From The Soul”, este é um álbum que ganha força com o tempo. Quanto mais se ouve, mais ele se expande. E é justamente essa capacidade de permanecer, de acompanhar o ouvinte sem se esgotar, que faz dele um dos registros mais relevantes e sinceros do ano.

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