Goo – Quando o Sonic Youth levou o ruído ao mainstream

Luis Fernando Brod
6 minutos de leitura
Sonic Youth Goo

Em 1990, o Sonic Youth lançava Goo, seu sexto álbum de estúdio e o primeiro por uma grande gravadora — a Geffen Records. Foi um passo decisivo para a banda nova-iorquina que, até então, era cultuada no circuito underground por sua abordagem experimental do rock, com guitarras dissonantes, afinação alternativas e uma postura abertamente contracultural. Goo não apenas colocou o Sonic Youth no mapa do mainstream como também ajudou a preparar o terreno para o estouro do rock alternativo no início da década de 1990, especialmente com o movimento grunge que viria logo a seguir

Formado em 1981 por Thurston Moore, Kim Gordon e Lee Ranaldo, o Sonic Youth foi um dos nomes mais influentes da cena no wave nova-iorquina — um movimento artístico e musical de espírito anárquico que misturava punk, vanguardismo e ruído. Durante os anos 1980, a banda lançou discos como EVOL (1986), Sister (1987) e o celebrado Daydream Nation (1988), este último um marco do rock alternativo, considerado por muitos como a obra-prima da banda.

Com Daydream Nation, o Sonic Youth já havia conquistado uma posição sólida como referência de integridade artística e sonoridade ousada. A crítica estava rendida, mas o alcance ao grande público ainda era limitado. Foi nesse momento que a banda, sem abrir mão da autonomia criativa, assinou com a Geffen Records — movimento semelhante ao que outras bandas alternativas fariam em breve, como o Nirvana.

Sonic Youth – Goo. Foto: Acervo Pessoal.

Entre o ruído e a cultura pop

Lançado em 26 de junho de 1990, Goo foi a tentativa do Sonic Youth de dialogar com um público mais amplo, mas sem diluir sua identidade sonora. A produção ficou a cargo do veterano Nick Sansano (Public Enemy, Run DMC) e de Ron Saint Germain (Jimi Hendrix, Bad Brains, Living Colour), garantindo um som mais limpo e acessível, mas ainda carregado de camadas de distorção, microfonia e atmosferas tensas.

A estética visual do álbum também marcou época. A capa — uma arte em preto e branco de Raymond Pettibon, baseada em uma fotografia policial — tornou-se icônica, antecipando o flerte do rock alternativo com elementos da cultura pop, do cinema B e da contracultura americana

Goo não foi apenas um sucesso de crítica — entrou na Billboard 200, um feito raro para uma banda com raízes tão experimentais. E, mais importante: mostrou que era possível fazer rock alternativo com visibilidade comercial, sem abrir mão da integridade artística.

Esse caminho foi fundamental para abrir espaço para a chamada explosão alternativa dos anos 90. O Nirvana, que abriria turnês para o Sonic Youth em 1991, viria a lançar Nevermind um ano depois. Não à toa, Kurt Cobain era um fã declarado da banda, especialmente da postura de Kim Gordon — um símbolo feminista que inspiraria diversas artistas da cena riot grrrl, como Kathleen Hanna, do Bikini Kill.

Bandas como Pavement, Pixies, Hole, Smashing Pumpkins e outras do rock alternativo dos anos 90 beberam diretamente da fonte estabelecida por discos como Goo.

As principais faixas

“Dirty Boots” abre o álbum com guitarras entrelaçadas e uma progressão crescente que culmina em uma catarse ruidosa — uma síntese da estética da banda. É uma das músicas mais “acessíveis” do disco, inclusive com direito a videoclipe na MTV.

“Tunic (Song for Karen)” é um dos pontos altos do álbum. Escrita e cantada por Kim Gordon, a música presta homenagem a Karen Carpenter, vocalista dos Carpenters, vítima da anorexia e da opressão da indústria fonográfica. O tom é irônico e sombrio, com camadas de crítica feminista que marcaram a obra de Gordon.

“Kool Thing”, talvez a faixa mais conhecida do disco, é uma colaboração com Chuck D do Public Enemy e também um manifesto feminista disfarçado de hit alternativo. Kim Gordon questiona a masculinidade tóxica da indústria musical e da cultura pop, com um groove hipnótico e riffs marcantes.

“Disappearer” retoma o lado mais introspectivo e etéreo da banda, enquanto “Mote”, cantada por Lee Ranaldo, explora estruturas mais fragmentadas e psicodélicas — lembrando os experimentos de Daydream Nation.

Goo representa o momento exato em que o Sonic Youth deixou de ser apenas uma banda cult para se tornar uma influência geracional. Não se trata de um disco “amaciado” para o mainstream, mas de um trabalho que consegue equilibrar acessibilidade e vanguarda, abrindo espaço para que a música alternativa pudesse ser ouvida em rádios, televisões e grandes festivais — sem perder sua essência provocadora.

Com Goo, o Sonic Youth provou que era possível furar a bolha do underground sem se vender. E, mais do que isso, mostrou que o ruído também pode ser pop — basta saber como moldá-lo.

Ouça se você gosta de:

Guitarras dissonantes, post-punk, noise rock, rock feminista, atmosferas urbanas e letras provocadoras.

Faixas essenciais:

Dirty Boots, Tunic (Song for Karen), Kool Thing, Mote.

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