Ozzy Osbourne e a consciência de seu próprio mito: “Ao menos serei lembrado”

Luis Fernando Brod
4 minutos de leitura
Ozzy Osbourne. Foto: Ross Halfin.

Três anos antes de morrer, Ozzy Osbourne refletiu com naturalidade sobre o fim. A conversa, publicada pela Rolling Stone em 2022, expôs sua visão direta e sem rodeios sobre como gostaria de ser lembrado.

“Fiz muita coisa para um simples cara da classe trabalhadora”, afirmou o cantor, então com 73 anos, à repórter Kory Grow.

“Fiz muita gente sorrir. Também fiz muita gente perguntar: ‘Quem diabos esse cara pensa que é?’”, completou, em tom bem-humorado.

Na mesma entrevista, Ozzy deixou claro que esperava ser reduzido, no obituário, ao episódio mais folclórico de sua carreira.

“Se morresse hoje, diriam: ‘Ozzy Osbourne, o homem que arrancou a cabeça de um morcego com os dentes, morreu num hotel…’”.

A cena, ocorrida em 1982 durante um show em Iowa, virou um símbolo involuntário da persona pública construída ao redor do artista.

A imagem do homem exagerado, capaz de comportamentos extremos, frequentemente ofuscava a dedicação ao estúdio e ao trabalho musical.

Por décadas, Ozzy foi retratado como excêntrico, imprevisível e instável. O próprio reconhecia os efeitos disso em sua reputação.

Ainda assim, nunca demonstrou ressentimento. “Não tenho do que reclamar. Ao menos serei lembrado”, concluiu na entrevista.

A fala resume o espírito com que encarava sua própria trajetória: entre o riso, a tragédia e a consciência de sua singularidade.

Ozzy nasceu em Birmingham, em 1948, e cresceu num ambiente operário, o que moldou sua visão prática sobre sucesso e fracasso.

A fama chegou com o Black Sabbath no fim dos anos 1960, e com ela vieram excessos, dependência química e um demorado processo de autoconstrução.

Demiti-lo em 1979 parecia o fim. Mas sua carreira solo contrariou expectativas e reposicionou o vocalista entre os nomes mais produtivos do metal.

Mesmo com idas e vindas, seguiu lançando álbuns até depois dos 70 anos, alguns deles durante o tratamento contra Parkinson.

A ironia, presente em várias entrevistas, foi um traço constante de sua personalidade — ainda que por vezes mal compreendido.

No fim da vida, sua lucidez sobre o próprio mito contrastava com o personagem amplificado por manchetes, reality shows e lendas.

Na conversa de 2022, sua preocupação parecia menos com a posteridade e mais com a forma como se sentia visto em vida.

Ao dizer que “fez muita gente sorrir”, Ozzy revelava um lado raramente destacado: o de alguém que se importava com a reação do público.

Mesmo reconhecendo os exageros, sabia que sua música, sua voz e sua presença marcaram pessoas ao redor do mundo.

A frase sobre a lápide diz mais sobre sua relação com a cultura pop do que sobre a morte: “Ozzy Osbourne, nascido em 1948, morreu assim e assim”.

Uma síntese que ignora prêmios, vendas ou palcos. E que resume, em poucas palavras, a tranquilidade com que aceitava o fim.

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