O álbum do Talking Heads que contou a história da vida de David Byrne

Luis Fernando Brod
5 minutos de leitura
Talking Heads. Foto: Arnold Stiefel Company/Talking Heads.

Nos anos 80, muitos filmes de música tentavam pegar uma banda no seu melhor momento, no auge da criatividade. Mas aí veio “Stop Making Sense”, dos Talking Heads, e fez muito mais. Esse filme virou um registro que não só mostrava a banda no seu ponto mais alto, mas também contava a história da transformação pessoal e artística de David Byrne, o líder do grupo. Com direção de Jonathan Demme, filmado em quatro noites seguidas no Pantages Theatre, em Hollywood, o filme queria ir além de um simples show. Era uma festa de tudo o que a banda tinha virado e do que representava.

O show começa de um jeito bem simples, quase íntimo. David Byrne aparece sozinho no palco, só com um violão e uma fita cassete tocando a base. Uma simplicidade que logo daria lugar a algo bem mais complexo. A cada música, mais gente da banda vai entrando, enchendo o palco e, o mais legal, a sonoridade. O que começa como um solo vira uma atmosfera vibrante, um verdadeiro mosaico de sons que pega a gente de jeito.

O quarteto original dos Talking Heads ganha a companhia de mais cinco músicos, que trazem vocais, percussão, sintetizadores e guitarras extras. Essa turma extra não só encorpa a música, mas a leva para outro nível. Naquela época, a banda já estava de olho nas influências africanas nos seus discos, e essa máquina cheia de ritmo que se formava no palco não só tocava as músicas, mas as fazia ganhar vida, dando a cada nota e batida uma personalidade única.

Assistir a “Stop Making Sense” é como embarcar numa viagem, mas, no fundo, o filme foi feito para levar a própria banda, e David Byrne, numa jornada de autodescoberta. O filme mostra como um cara meio desajeitado e sozinho, cantando para si mesmo, vira alguém cheio de confiança, talvez até grande demais para ele mesmo. Byrne, em especial, muda bastante durante o show, e essa mudança só acontece por causa da galera que vai se juntando a ele.

Numa entrevista para a NPR Music em 2023, comemorando os 40 anos das filmagens, Byrne pensou alto sobre o quanto o filme ainda mexe com a gente. Ele contou que o filme não só conta uma história visual, mas também mostra um pouco de quem ele virou com o tempo. “Você vê esse cara no começo que é meio nervoso, tropeçando e cantando ‘Psycho Killer'”, disse ele, falando da imagem que criou no filme: um terno gigante, movimentos meio desengonçados, uma certa frustração com a própria timidez.

Mas essa imagem vai mudando aos poucos. Conforme a banda se completa e a energia explode, chegando ao clímax em “Burning Down the House”, o show vira uma festa que contagia todo mundo. Byrne vê essa virada com clareza: “No final, ele se entrega à música e fica bem feliz, o máximo que podia ser naquela hora. E ele encontra uma espécie de comunidade”. Essa entrega à música e a descoberta de um lugar para chamar de seu são o coração da jornada dele no filme.

A mudança rápida de Byrne em “Stop Making Sense” reflete bem o que ele fazia na arte. As músicas de “Talking Heads: 77” são cheias de empolgação e ideias novas, mas têm uma pontinha de insegurança. No terceiro disco, “Fear of Music”, essa hesitação já começa a sumir, e em “Speaking in Tongues”, o álbum mais novo quando “Stop Making Sense” saiu, ela quase não existe mais. Dá para ver como um filme de show, claro, mas a real é que “Stop Making Sense” é bem mais que isso; é a prova da transformação de um artista e de como a música pode mostrar e até mudar o que a gente é.

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