Vic Rattlehead mexeu com a minha cachola (e vai mexer com a sua também!)

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Saudações cósmicas e musicais! E não é incrível quando a gente vai em busca de boa música e, de quebra, encontra uma boa mensagem? Por boa mensagem eu não me refiro a metáforas mega cafonas, otimismo utópico, moralismo barato e muito menos historietas pastelonas. Refiro-me, não necessariamente a coisas que gostaríamos de ver e ouvir, mas a coisas que precisamos ver e ouvir de quando em quando, evocando uma fala muito notória do grande Alan Moore.

O Megadeth é uma bandaça indiscutível, doa a quem doer, e pratica o subgênero metálico que encarna a crítica, especialmente social, e o protesto, a saber, Thrash Metal. E soube corporificar uma crítica certeira, pesada e sempre necessária na figura de uma mascote inesquecível que, na minha singela opinião, deveria ter dado as caras em mais capas do que deu ao longo da extensa trajetória da banda: Vic Rattlehead.

Nosso querido e emblemático Vitão Cabeça de Chocalho talvez não rivalize com um Eddie (mas quem rivalizaria?), contudo, constitui uma figura clássica do metalzão e merece ser amplamente conhecido e entendido nos elementos que o compõem. E como se não bastasse o alerta sobre um mal que paira sobre nós desde os primórdios tempos em que a humanidade passou a se organizar em sociedades, ele remete à cultura clássica subvertendo certa lenda com a qual muita gente certamente já teve contato, quem sabe, na forma de um conjunto de bibelôs na estante da casa da mãe ou da vó.

Os Três Macacos sábios tipificam uma peça de filosofia japonesa que consiste em não ver o mal, não ouvir o mal e não falar o mal. Mizaru corresponde àquele que cobre os olhos, Kikazaru, ao que cobre os ouvidos e, por fim, Iwazaru é o que cobre a boca. Se, por um lado, essa máxima pode ser entendida como diretiva pra uma vida boa e saudável, onde não se perde tempo vendo e ouvindo atos reprováveis e abstendo-se de fazer fofocas, por outro, pode ser corrompido como uma ode à tão infame vista grossa. E é pra esse lado que aponta, com dedos esqueléticos, o icônico Vic, unindo numa única e inesquecível figura os três macaquinhos e nos alertando quanto a algo que parece ter voltado com tudo em tempos de hiperconectividade, especialmente para nós que tanto apreciamos um bom Metal Pesado, seja na vertente que for: a censura.

Verdade seja dita: podemos (e em muitos casos, penso eu, devemos!) discordar de muita coisa que Dave Mustaine expressa em entrevistas. Porém, entretanto, todavia, contudo, se tem uma coisa que esse sujeito sabe fazer bem é nomear álbuns e músicas, lançando mão de trocadilhos e neologismos inteligentes, cáusticos e chicletosos! E em termos de artes gráficas, de modo geral, o Megadeth sempre esteve muito bem servido e auxiliado de grandes nomes que vão de Hugh Syme a Ed Repka.

Vic Rattlehead abrilhanta com sua presença assustadora e marcante, acentuando metalicamente a tão condenável vista grossa, os quatros primeiros álbuns do Megadeth pra reaparecer lá em 2004 em The World Needs A Hero, numa ideia sugestiva, que casa bem com o título, porém que (opinião pessoal!), eu creio que poderia ter sido melhor executada. Nesse ínterim, também tivemos grandes artes, com destaque para o clássico Youthanasia, mas fala sério, na minha cabeça, e, quem sabe, na de mais gente, aquela mesmíssima cena poderia estar sendo protagonizada por ele num cenário apenas mais um tantinho distópico. O que já me puxa para a capa do Dystopia, em total sintonia com os nossos tempos tão marcados pelos excessos tecnológicos e que, portanto, traz uma versão mais robotizada dele.

Mas não para por aí! Do futuro ao passado, temos alusão a um período nefasto: a peste bubônica que assolou o medievo e, nesse contexto, um Vic trajado tal como os médicos da época e não mais como o engravatado anti-Metal, em The Sick, the Dying… and the Dead de 2022. Retomando o papo sobre deixar a imaginação voar, por vezes eu penso se a capa de Countdown to Extinction não teria sido ainda mais massa, furiosona, furiosíssima, se ao invés daquela figura esfaimada e desesperada, tivéssemos a arte de contracapa onde Vic, num traje escuro e volumoso, que se mistura com o fundo e me lembra uma toga de juiz, conta craniozinhos em um ábaco sinistraço!

Discreto, entretanto onipresente, é como Vic se apresenta nas artes da coletânea Greatest Hits: Back to the Start e no álbum Super Collider, tal como os mazelas que ele representa e que pairam sobre nós, voltando, de tempos em tempos a nos assombrar, seja de maneira explícita e truculenta, seja de modo sutil e revestido das ditas melhores intenções. Megadeth em letra, som e artes gráficas segue sendo um baluarte do Metal crítico, raivoso e inconformado com sistemas que falham (sim, com todos os trocadilhos pretendidos nessa tiradinha!) e tentam nos convencer de que pensar livremente é crime.

E Já que eu aludi ao The System Has Failed, que traz uma das capas da banda que mais me agradam, aludo também ao título da primeira faixa dele: Blackmail the Universe, ou, chantageie o universo. Eis uma palavra que eu não ouço há muito tempo, porém, a título de curiosidade, não é doido como certas coisas feias que certas palavras designam começam a virar “novo normal” quando essas palavras caem em desuso? Que enferrujem em paz, mas só se a gente abrir mão de pensar. Viva o Thrash Metal, viva o Megadeth e Vic Rattlehead.

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