Som-Realismo em Baixa Fidelidade, novo álbum do projeto musical Potente Durâmen, é mais um mergulho de cabeça no experimentalismo eletrônico inspirado na cultura lo-fi que apresenta canções em um clima jazzístico ao ritmo de chillwave, r&b, trip hop, dark ambient, dubstep e reggaefusion. O trabalho foi concebido sob a ótica do surrealismo ao aliar a espontaneidade e a imaginação com poucos recursos e muita liberdade criativa, utilizando sensibilidade e fantasia como elementos fundamentais.
Como o próprio título sugere, a qualidade sonora emula as imperfeições de uma gravação caseira com uso deliberado de efeitos vocais, distorções e ruídos ao fundo, criando uma estética musical despojada e trazendo o ouvinte para uma atmosfera intimista ao simular uma realidade analógica em tempos de inteligência artificial.
Em letras que falam sobre sentimentos, questões existenciais, política, meio ambiente, sinais dos tempos e otimismo em relação à vida, a produção foca no estilo faça-você-mesmo e de orçamento parco resgatando, ainda que virtualmente, um saudosismo noventista, lúdico, mais simples no jeito de viver e indo na contramão da aceleração industrial.
A sensação de melancolia ou nostalgia permeia a audição como uma fuga da velocidade dos dias atuais.
O play começa com a sonoridade abafada e levemente ruidosa de um rádio velho em Aprender Com As Quedas, uma singela canção de amor que parece ter saído de um clube de jazz imaginário, em algum subterrâneo situado no centro da cidade do Rio de Janeiro, com acompanhamento de contrabaixo acústico, bateria e piano. Na sequência, segue o som Em Busca da Leveza com seu simpático trumpete introdutório apoiado pela batida chill-hop, dando o tom de uma manhã preguiçosa e ensolarada. A atmosfera melancólica da terceira faixa, A Visão Que Nos Falta, apresenta uma voz com efeitos de distorção que nos remete a um astronauta, olhando lá de cima através do monitor, expressando sua solidão. Mas logo que entra o synth-wavebeat, voltamos à realidade da Terra com seus egoísmos e burocracias.
De pés no chão, Fincando Raízes encanta com seu charme feminino ao cantar no ritmo do r&b que devemos ter fé na vida, plantar nosso legado e florescer positivamente. E se viver já é, por si só, um ato político, Embates e Contrastes — marcada pela levada do boom bap até chegar em um lindo refrão — fala das contradições em meio às polarizações ideológicas que muitas vezes confundem e deixam o povo perdido sem solução para suas necessidades mais básicas. Fim do primeiro ato! Hora de tomar um café e relaxar com a delicadeza do tema instrumental Vou Ali e Já Volto! (Interlúdio), a sexta faixa.
Continuando a caminhada, seguimos a jornada através do surrealismo de Passos Errantes, um trip hop tropical conduzido por uma narradora melódica e obstinada, que pode soar como uma trilha sonora de um filme criado por sua cabeça onde você é o diretor. Após essa experiência, a cena muda para o ambiente sombrio e apocalíptico de Revelações, onde os sinais dos tempos são anunciados por um arauto de voz soturna e semi-sussurrada para em seguida modular o tom e bradar por Jah, num arranjo que combina uma pulsante batida que remete ao hip-hop e strings de estilo neoclássico.
Amarga Colheita, a faixa nove, é um dubstep bem brasileiro introduzido por um emcee cheio de atitude que faz uma contundente apologia à defesa do meio ambiente, e denuncia: “A natureza grita, mas quem vai ouvir?/Se o ouro nos olhos nos faz sucumbir”. Nem tudo está perdido e eis que chega O Brilho da Esperança, um jazzístico trip hop que destaca a louvação iluminada de uma diva por dias melhores em um mundo atribulado. E encerrando essa viagem musical, a décima primeira faixa retoma o mesmo tema político-ideológico da quinta e transforma-se no reggae fusion dançante de Embates e Contrastes 2.
FICHA TÉCNICA
• Concepção artística e musical, seleção de repertório, produção e edição digital: Gusnob DeSaints.
• Arranjos, programações, samples e efeitos: Sun-O Arin
• Todas as músicas compostas por: G. Nobio
Vocais de… Rimano Grão-Notável (faixas 1, 3, 5 e 8), David Skybeat (faixa 2), Monica Lacov (faixas 4 e 7), Laura Tarcan (faixa 10) e Gustavo Nobio (faixas 9 e 11)
Potente Durâmen foi criado pelo cantor, compositor e rapper Gustavo Nobio, da cidade de Niterói (RJ).
Deixe um comentário