O Redação DISCONECTA, no seu episódio 085, mergulhou nos 30 anos do icônico álbum “Different Class” do Pulp. O podcast semanal, apresentado por Marcelo Scherer, Luis Fernando Brod e Julio Mauro, dedicou a conversa a celebrar este que é considerado o ponto de virada na discografia da banda inglesa.
A surpresa em meio ao Britpop
Marcelo Scherer iniciou o programa notando que o lançamento de “Different Class” em 1995 ocorreu no auge do Britpop, dominado por nomes como Oasis e Blur. Contudo, o disco do Pulp apresentava uma pegada diferente, com toques de new wave.
Julio Mauro confessou que, apesar de gostar de Blur e Oasis, não conhecia o Pulp e foi uma “grata surpresa” descobrir o álbum para a gravação do programa. Ele considerou “Different Class” como o disco que mais o surpreendeu no ano. Já Brod e Marcelo notaram que o Pulp já tinha 17 anos de carreira antes de estourar com este álbum, sendo uma das bandas inglesas que alcançaram sucesso tardio, surgindo nos anos 80 ao lado de Suede e Stone Roses.
A sonoridade do Pulp, especialmente em “Different Class”, sempre foi mais eclética do que o rótulo Britpop sugeria. Os hosts enfatizaram que Jarvis Cocker e a banda sempre abominaram o rótulo Britpop, que, segundo Brod, eles viam como “olhar para o passado”.
As semelhanças vocais e a arte de contar histórias
Um dos pontos altos da discussão foi a performance vocal de Jarvis Cocker. Marcelo perguntou a Brod se era impressão sua que Cocker tinha uma certa semelhança com David Bowie, especialmente nas partes mais altas das músicas. Julio Mauro concordou que a semelhança era tanta que, ao ouvir pela primeira vez, parou o disco pensando que Bowie havia feito uma participação. Brod complementou que, além de Bowie, a forma de cantar de Cocker, onde a música é declamada como poesia ou contação de história, também remete a Elvis Costello.
Cocker sempre foi inspirado pela teatralidade. De fato, Julio Mauro notou que a abordagem das letras é quase como um “teatro”. O álbum tem uma característica “cinematográfica”, como se fosse um roteiro de filme ou uma trilha sonora, com elementos épicos. Brod, inclusive, afirmou que a performance de palco de Cocker é “extraordinária” e que ele sabe contar uma história como ninguém.
Os hosts destacaram que essa pegada experimental e a recusa em se prender a um rótulo específico fazem o Pulp se assemelhar ao Suede, duas bandas que consideraram “muito mais legais” do que as mais conhecidas do Britpop, como Oasis e Blur, por “experimentarem mais”.
Temas sociais e histórias de capa
O título “Different Class” reflete o foco nas diferenças de classes sociais britânicas. Marcelo e Julio notaram que as letras têm um “humor britânico” e parecem contar o dia a dia da classe trabalhadora. Julio Mauro chegou a classificar algumas letras como “punk”, ou pelo menos, muito incisivas, abordando o antagonismo social.
Outro tema lírico explorado é o voyeurismo. A música “I Spy” foi citada como tendo um teor quase agressivo, onde o narrador vigia o outro e “sabe mais do que deveria saber”. Essa temática, segundo os hosts, reflete o contexto de Sheffield, cidade natal da banda, que era muito industrial e historicamente dividida, especialmente durante a época de Margaret Thatcher.
A história por trás da capa do disco também chamou a atenção. A capa é uma foto real de um casamento. O noivo, amigo do fotógrafo, permitiu que as fotos da cerimônia fossem usadas. Essa foto incluiu os familiares e não foi uma foto arranjada. Na primeira edição (first press), o comprador poderia escolher qual capa de casamento queria.
Destaques musicais e influências
Os hosts mencionaram várias faixas importantes:
- “Miss Shapes”: Julio destacou esta como a faixa de abertura que o conquistou imediatamente.
- “Common People”: O maior sucesso da carreira da banda.
- “Something Changed”: Brod elegeu-a como sua preferida do disco, elogiando a letra que começa: “I wrote the song two hours before we met / I didn’t know your name or what your looked like yet…“.
- “Disco 2000”: Esta faixa rendeu uma surpresa: Julio comentou que a introdução lhe lembrava “Lindo Balão Azul” de Guilherme Arantes, mas a banda na verdade se inspirou em “Gloria” de Laura Branigan. A música também tem uma história sentimental, escrita para uma amiga de infância de Cocker, onde eles imaginam como teria sido a vida se tivessem se tornado um casal.
- “Monday Morning”: Marcelo notou que esta faixa traz a influência do dub, algo incomum, mas historicamente importante para o rock inglês.
Além disso, a influência direta de David Bowie é sentida em faixas como “Underwear” e “Live Bed Show”.
A sonoridade synth e disco marcante do álbum é muito creditada à tecladista e violinista Candida Doyle. Ela é considerada a integrante feminina responsável pelos timbres oitentistas presentes.
Apesar do uso de teclados com timbres datados, a conclusão dos hosts foi unânime: o disco não está datado. Segundo Brod, isso se deve ao fato de que muitas bandas atuais ainda utilizam esses artifícios musicais.
“Different Class” é, portanto, um álbum histórico que não apenas triunfou comercialmente (derrotando o Radiohead e ganhando o Mercury Prize) mas também se diferenciou dentro da cena de 1995.




