50 anos de “Fruto Proibido” da Rita Lee | Redação DISCONECTA #65

Marcelo Scherer
8 minutos de leitura

Nesta edição especial do podcast Redação DISCONECTA, o anfitrião Luis Fernando Brod recebeu a jornalista Mari Casé, para um bate-papo aprofundado sobre um dos álbuns mais emblemáticos da música brasileira: “Fruto Proibido” de Rita Lee, que completou 50 anos em 30 de junho, data da gravação do programa. O álbum, considerado um marco e um ponto de virada na carreira de Rita Lee, foi o centro de uma conversa repleta de insights e celebração.

Um marco na carreira de Rita Lee

“Fruto Proibido” é unanimemente reconhecido como o álbum que marcou uma guinada decisiva na carreira solo de Rita Lee. Após sua saída dos Mutantes, este disco a consolidou como uma artista independente e alcançou um sucesso estrondoso, vendendo cerca de 200.000 cópias na época, um número impressionante para o rock nacional. Mari Casé ressaltou que, diferentemente de trabalhos anteriores, neste álbum Rita Lee teve “100% de decisão do que ela queria”. Essa liberdade criativa foi fundamental para que ela explorasse sua própria identidade artística, afastando-se das sonoridades mais psicodélicas dos Mutantes e demonstrando seu imenso potencial para o público e as gravadoras.

O disco se destaca por sua mistura de influências, resultando em uma sonoridade à frente de seu tempo. Há uma forte presença dos Beatles, notável nos vocais e na forma de composição de algumas músicas, que evocam o rock pop e as letras acessíveis do quarteto de Liverpool. Além disso, o álbum incorpora elementos do blues e do hard rock, influenciado pelo guitarrista Luiz Carlos Carlini, um grande fã de Jeff Beck. A banda Tutti Frutti, descrita como “muito hard rock”, foi essencial para a sonoridade mais “crua” e “rock and roll” do disco, com Mari Casé destacando que a escolha dos “grandes músicos” elevou o patamar do álbum a “1000% de qualidade”. Embora alguns o classifiquem como glam rock, Brod e Mari concordam que é “muito mais hard rock mesmo muito mais rock do que do que glam rock”, apesar de conter elementos sutis como saxofone e flauta.

A figura transgressora e feminista de Rita Lee

Rita Lee é retratada como uma artista que consistentemente fugiu da zona de conforto, desafiando expectativas e normas sociais, especialmente em relação ao papel da mulher na música e na sociedade. Ela reforçou sua postura de “ovelha negra”, mostrando que “a mulher pode decidir por si”. O disco, embora não explicitamente militante, é inerentemente feminista. Rita “não gostava de levantar bandeiras”, mas, como Mari afirmou, “ela é o feminismo por si só”. As letras, muitas das quais cocriadas com parceiros como Paulo Coelho e Lee Marcucci, falam de “liberdade sexual sem falar de sexo”, “liberdades de escolhas” e “libertação de liberdade de ser quem você é”, de forma sutil, mas poderosa.

Em uma época onde “o rock sempre foi uma coisa de bandido”, de “machão”, Rita Lee surgiu com presença de palco, cantando músicas que abordavam temas de liberdade e autoconfiança. Ela demonstrou que a mulher “poderia ser igual ou melhor do que eles fazendo o que ela queria fazer”, sem “copiar o rock de homem”. Rita Lee foi muitas vezes “muito subestimada” em sua carreira, mas “Fruto Proibido” provou seu potencial “muito grande que não era aproveitado”, evidenciando sua versatilidade como musicista, tocando piano, melotron, violão e flauta transversal.

Apesar de não ser 100% autobiográfico, o álbum capta profundamente a essência e o momento de vida de Rita Lee. “Ovelha Negra” é destacada como a música “100% autobiográfica”, que representa a própria artista e sua jornada. As parcerias nas composições conseguiram “captar a essência do que ela tava querendo passar”, especialmente devido ao processo de imersão da banda e parceiros em uma casa para criar o álbum. Mari Casé sugeriu que “se alguém quer conhecer a Rita não só como como artista mas como como ser humano assim acho que esse disco é o disco que eu apresentaria”. Rita Lee, como grandes artistas, permitia que suas músicas fossem “interpretadas de qualquer maneira” pelo público, refletindo a capacidade de suas obras ressoarem de diferentes formas.

O impacto de Fruto Proibido

“Fruto Proibido” não é apenas um disco, mas um fenômeno cultural que criou o caminho para muitas artistas e solidificou Rita Lee como um ícone brasileiro. Sua importância para o movimento do rock e para as mulheres é inegável, mostrando que “a mulher roqueira ela quer quer mostrar conteúdo”. Rita Lee é considerada um “ícone da música brasileira”, comparável a Elza Soares para o samba e Gal Costa para a MPB, sendo “onipresente” na cultura do país.

O álbum, que inicialmente recebeu uma recepção mista da crítica especializada, que “desceu a lenha”, rapidamente se tornou um clássico. Ele é “reverenciado” e figura em listas de “discos mais importantes da música brasileira”, como a de Ricardo Alexandre (15º) e a da Rolling Stone (16º). Apesar da dúvida se o álbum teria o mesmo impacto se lançado hoje, Brod e Mari concordam que sua mensagem de liberdade e autenticidade é atemporal, e ele “tem que ser descoberto pelos mais jovens”.

Entre as músicas de destaque, além da já mencionada “Ovelha Negra” (considerada um dos solos mais bonitos do rock brasileiro), estão “Agora Só Falta Você”, um “grito de liberdade”, e “Esse Tal de Rock and Roll”, uma espécie de manifesto composta com Paulo Coelho, notável pela interpretação e vocais de Rita Lee. A música “Luz de Fiego” também foi mencionada por sua letra forte e mensagem poderosa.

Em suma, “Fruto Proibido” é mais do que um álbum; é o resultado de uma “travessia da mulher colocada à margem”, que, de “coadjuvante”, “emergiu [como] uma artista completa” e “do silêncio da expulsão veio a voz [que viria a ditar] décadas da música brasileira”. Este disco representa a ascensão de Rita Lee de uma artista subestimada a um “furacão” e uma “front woman inigualável”, deixando um legado duradouro de liberdade criativa, transgressão e empoderamento feminino na história da música brasileira. É um disco que deve ser “ouvido com calma de cabarrabo sem pular”.

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