No episódio 67 do podcast Redação DISCONECTA, os apresentadores Luis Fernando Brod, Marcelo Scherer e Victor Persico mergulharam na rica história e no impacto do álbum “Venus and Mars” do Wings, que em 2025 celebra 50 anos de seu lançamento. A conversa detalhou o contexto, as características musicais, as dinâmicas internas da banda e o legado.
Lançado em 27 de maio de 1975, “Venus and Mars” é o quarto álbum de estúdio do Wings e chegou logo após o “estrondoso sucesso de Band on the Run”, um disco “avassalador” e considerado um clássico. A expectativa em torno de seu lançamento era altíssima e representava um grande desafio. No entanto, Paul e sua banda “acertaram a mão”, entregando um álbum que não apenas atendeu às expectativas comerciais, mas também cimentou a formação que muitos, incluindo o próprio Paul, consideram a “mais perfeita do Wings”. Esta formação contava com a entrada do guitarrista Jimmy McCulloch e do baterista Joe English, que se juntaram a Paul, Linda e Denny Laine.
“Venus and Mars” é unanimemente considerado um “disco clássico” pelos participantes do podcast. Diferentemente de “Band on the Run”, que alcançou o terceiro ou quinto lugar nas paradas, “Venus and Mars” foi direto para o primeiro lugar, solidificando a carreira de Paul McCartney com o Wings. De maneira bem-humorada, um dos participantes sugere que “talvez o maior defeito do Venus and Mars é não ser o “Band On The Run”, mas prontamente ressalta que é um disco repleto de canções populares e comerciais, “radiofônicas” e que soavam muito bem nas rádios da época, e ainda soam bem hoje.
O álbum é descrito como “muito setentista”, um verdadeiro “retrato daquela época”. Ele incorpora “várias influências assim de cultura pop, psicodelia, referências aos próprios Beatles e rifes assim grudentos”. Apresenta uma “pegada de glam” e “flertes com vários estilos”, incluindo “prog” e “arena rock”. A versatilidade de Paul McCartney, que “canta um pouco de tudo, na balada, a coisa mais folclórica”, é comparada à de Burt Bacharach.
Um ponto de destaque é a produção do álbum, descrita como “claríssima” e “refinada”. O som do baixo, especialmente o Rickenbacker, é elogiado por ser “muito pesado” e “perfeitamente” audível, inclusive em apresentações ao vivo como o “Rock Show”. A mudança do baixo Hofner para o Rickenbacker influenciou “muito” a sonoridade do Wings. Além disso, muitas músicas do álbum são apontadas como funcionando “muito bem em grandes estádios”, adaptando-se perfeitamente ao formato de “rock de arena”, que estava em seu auge na década de 70.
Apesar de ter sido lançada como single, a música “Listen to What the Man Said” não é considerada a melhor escolha pelos participantes, sendo vista como uma “balada datada” e muito característica dos anos 70. No entanto, a faixa conta com participações notáveis de David Manson (Traffic) e Tom Scott (LA Express, Blue Brothers).
Outras faixas são destacadas:
- “Letting Go” é a música que “marcou” a vida de um dos participantes, com um riff “incomparável”.
- “You Gave Me the Answer” é considerada a faixa que “mais se aproxima dos Beatles”, com um estilo que remete a “Honey Pie” e “When I’m 64”, uma “musiquinha de salãozinho” que Paul McCartney dedicava a Fred Astaire em alguns shows.
- “Magneto and Titanium Man”, com suas referências aos personagens da Marvel, é citada como exemplo da diversidade do álbum, tendo sido considerada “fantástica” e uma “narrativa” por Stan Lee.
- “Spirits of Ancient Egypt” é uma música “viajandona” cantada por Denny Laine.
- “Treat Her Gently / Lonely People” são elogiadas por seus “arranjo fodido” e beleza.
- “Rock Show” é destacada como abertura de shows e uma faixa com o baixo muito presente, tendo sido inclusive regravada pelo Kiss em um álbum tributo.
- A sequência “Venus and Mars / Rock Show” é notável por suas duas músicas distintas que se emendam, criando uma “fluidez” e um aspecto “conceitual” ao álbum, apesar de não ser um disco conceitual.
A entrada de Jimmy McCulloch e Joe English foi um marco para a formação considerada “perfeita” do Wings. A participação de Denny Laine é ressaltada como fundamental. Vindo do Moody Blues, ele trouxe uma “experimentação” e “arranjos” que foram uma “potência” para o Wings, e sua influência fez a sonoridade de Paul McCartney mudar em relação aos Beatles. Paul McCartney, apesar de ser a força principal, “deixava aberto para para todos colaborarem com suas ideias”. Era uma regra no Wings que todos os membros eram “obrigados a cantar alguma música”, seguindo uma “escola” de músicos que não se dedicavam a apenas um instrumento. Os vocais de Paul e Linda “casavam literalmente”, com o “agudinho clássico do Paul McCartney” se encaixando perfeitamente com o de Linda. Apesar do sucesso, o álbum foi feito em um período de “tensão” na banda, com a saída de Geoff Britton e a entrada de Joe English.
O Wings deu a Paul McCartney “uma liberdade maior” do que ele teria na época dos Beatles, permitindo-lhe fazer o que queria enquanto dava espaço aos outros membros. Ele também evoluiu significativamente como produtor. Enquanto o primeiro álbum do Wings (“Wild Life”) tinha um aspecto mais “low-fi” e “menos polido”, “Venus and Mars” demonstra uma produção “claríssima” e “refinada”. Paul produziu a maioria de seus álbuns até “Back to the Egg” (1979). George Martin, o lendário produtor dos Beatles, participou de alguns álbuns solo de Paul McCartney em fases posteriores de sua carreira, como “Tug of War”, “Pipes of Peace” e uma faixa em “McCartney III”.
Em 1975, Paul McCartney estava em sua “ascendente”. Enquanto isso, John Lennon lançava um disco de covers (“Rock ‘n’ Roll”), e George Harrison lançava um álbum considerado mais fraco (“Extra Texture”). Ringo Starr é descrito como o Beatle que “mais se divertiu” após o fim da banda, fazendo música “easy listening” e colaborando com diversos amigos, incluindo John Lennon no “Plastic Ono Band”.
O álbum foi “escrito” durante as férias de Paul McCartney na Jamaica. A gravação principal ocorreu no Sea-Saint Studios, em Nova Orleans, estúdio de Allen Toussaint, que também tocou piano em “Rock Show”. Apesar de Nova Orleans ser reconhecida como o “berço do jazz” e do “vodu”, o álbum de McCartney curiosamente não apresenta influências desses gêneros. Parte da gravação também ocorreu no Wally Heider Studios, em Hollywood/Los Angeles, e o álbum foi finalizado em Abbey Road.
“Venus and Mars” influenciou a decisão de Paul McCartney e o Wings de lançar o álbum ao vivo “Wings Over America” (1976), mostrando a crescente vontade da banda de se apresentar em “arena”. Com o Wings, Paul McCartney teve pela “primeira vez” uma “banda de peso”, com músicos que, em termos de sonoridade, “conseguem ficar acima… em relação aos Beatles”. Uma discussão fascinante no podcast girou em torno da competitividade entre os Beatles e os Beach Boys. A influência dos Beach Boys (especialmente de “Pet Sounds”) na evolução vocal e de produção dos Beatles, e vice-versa, foi um motor de aprimoramento mútuo. A perfeição vocal dos Beach Boys é destacada por um dos participantes como superior à dos Beatles, e essa “competitividade” elevou o nível musical de ambas as bandas, impactando a música pop como um todo.