Beneath the Remains, a brutalidade refinada do Sepultura

Lançado em 7 de abril de 1989, Beneath the Remains marca um ponto de virada na trajetória do Sepultura. O terceiro álbum da banda trouxe um salto expressivo em termos de produção e composição, consolidando sua presença no cenário internacional do thrash metal. Foi o primeiro trabalho do grupo pela Roadrunner Records, um contrato que possibilitou não apenas um refinamento sonoro, mas também uma maior exposição global.

Com uma sonoridade que equilibra brutalidade e técnica, o disco destaca o trabalho de guitarras de Andreas Kisser e a abordagem intensa e complexa de Igor Cavalera na bateria. O Sepultura deixou para trás as limitações de suas primeiras gravações e entregou um álbum coeso, agressivo e sofisticado, capaz de rivalizar com gigantes do gênero.

Antes de Beneath the Remains, o Sepultura já era um nome respeitado no underground do metal extremo, principalmente no Brasil e em partes da Europa. Os dois primeiros álbuns, Morbid Visions (1986) e Schizophrenia (1987), mostravam um grupo com potencial, mas ainda buscando identidade e estrutura.

O lançamento de Schizophrenia chamou a atenção da Roadrunner Records, gravadora holandesa que na época expandia seu catálogo de metal extremo. A qualidade das composições e a evolução técnica da banda foram determinantes para que Monte Conner, executivo da Roadrunner, assinasse com o Sepultura. Essa parceria foi fundamental para o crescimento do grupo.

A partir desse momento, o Sepultura teve acesso a um orçamento maior, um produtor experiente e a possibilidade de gravar com melhores condições técnicas. O resultado foi um álbum que representou um salto gigantesco em relação aos trabalhos anteriores.

Diferente dos discos anteriores, gravados no Brasil com produção limitada, Beneath the Remains contou com a experiência de Scott Burns, um dos mais influentes produtores do metal extremo. Burns já havia trabalhado com bandas como Death e Obituary e ajudou a moldar o som da cena death metal da Flórida.

Sepultura – Beneath the Remains. Acervo Pessoal

As gravações ocorreram no estúdio Nas Nuvens, no Rio de Janeiro, em dezembro de 1988. Mesmo com um orçamento apertado, Burns conseguiu extrair um som mais polido e pesado do que nos discos anteriores. Seu trabalho foi essencial para tornar a brutalidade do Sepultura mais acessível sem comprometer a agressividade da banda.

Andreas Kisser comentou em entrevistas que a gravação foi intensa, com longas sessões e experimentações sonoras. Burns ajudou a lapidar as composições, tornando os arranjos mais precisos e o som mais equilibrado. O resultado foi um dos álbuns mais bem produzidos do thrash metal da época.

A sonoridade de Beneath the Remains reflete um Sepultura que amadureceu. O álbum mantém a ferocidade dos primeiros trabalhos, mas adiciona maior sofisticação técnica e uma produção mais refinada. A combinação de riffs velozes, estruturas bem construídas e uma bateria agressiva criou um som que se destacava dentro do thrash metal.

O trabalho de guitarra de Andreas Kisser e Max Cavalera é um dos pontos altos do disco. Os riffs são cortantes, rápidos e variados, com influências de Slayer, Kreator e Possessed. Os solos de Kisser, por sua vez, mostram um avanço significativo em relação a Schizophrenia, com mais precisão e feeling.

Igor Cavalera entrega uma performance impressionante, combinando velocidade e complexidade rítmica. A bateria em Beneath the Remains é mais versátil do que nos discos anteriores, incorporando elementos que vão além do thrash metal tradicional. Igor adiciona viradas rápidas e variações rítmicas que enriquecem a dinâmica das faixas.

Max Cavalera demonstra evolução como vocalista. Seu timbre é mais encorpado e sua interpretação transmite urgência e agressividade. As letras abordam temas como guerra, morte e opressão, refletindo influências de bandas como Metallica e Slayer, mas com uma identidade própria.

A composição das faixas de Beneath the Remains mostra um Sepultura mais coeso. As músicas são bem estruturadas, alternando momentos de extrema velocidade com passagens mais cadenciadas.

“Beneath the Remains”

A faixa-título abre o disco com um violão melancólico antes de explodir em um dos riffs mais memoráveis do Sepultura. A música estabelece o tom do álbum, com uma estrutura bem trabalhada e um refrão marcante.

“Inner Self”

Uma das músicas mais conhecidas do álbum, “Inner Self” traz um andamento mais cadenciado, destacando a força dos riffs e a bateria precisa de Igor Cavalera. A letra aborda a busca por identidade e liberdade em meio ao caos.

“Stronger Than Hate”

Com participação de músicos do Death e Obituary nos backing vocals, essa faixa se destaca pela agressividade e pelo trabalho de guitarras afiado.

“Mass Hypnosis”

Uma das composições mais elaboradas do disco, “Mass Hypnosis” alterna momentos rápidos com passagens mais atmosféricas, criando uma sensação de tensão e urgência.

A capa de Beneath the Remains foi criada pelo artista Michael Whelan, conhecido por suas ilustrações de ficção científica e horror. A imagem de um crânio parcialmente encoberto por sombras se tornou uma das mais emblemáticas da história do metal.

O próprio Sepultura escolheu a arte de Whelan após ver seu trabalho em livros e capas de álbuns. O visual da capa reflete perfeitamente a atmosfera sombria e opressiva do álbum.

O lançamento de Beneath the Remains fez o Sepultura sair do underground e ganhar reconhecimento internacional. O álbum recebeu elogios da crítica e colocou a banda no radar de fãs fora do Brasil.

A Roadrunner Records apostou no grupo, garantindo turnês ao lado de bandas como Sodom e Faith No More. A exposição ajudou a consolidar o Sepultura como uma das principais forças do thrash metal no final dos anos 1980.

Além de impulsionar a carreira do Sepultura, Beneath the Remains abriu caminho para outras bandas brasileiras no exterior. O álbum mostrou que o Brasil podia produzir metal de alto nível, influenciando gerações futuras.

Mais de três décadas após seu lançamento, Beneath the Remains continua sendo um dos álbuns mais importantes da história do thrash metal. O disco representou a transição do Sepultura de banda promissora para um dos nomes mais respeitados do gênero.

Com uma produção refinada, composições afiadas e uma energia brutal, Beneath the Remains não apenas marcou a história do Sepultura, mas ajudou a moldar o som do metal extremo nos anos seguintes.

Se há um álbum que simboliza o momento em que o Sepultura saiu do underground para o mundo, esse álbum é Beneath the Remains.

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