Wet Leg troca o cinismo pelo desejo em “Moisturizer”

“Moisturizer” me pegou desprevenido. Achei que sabia o que esperar de um segundo disco do Wet Leg — mais ironia, mais refrões grudados na cabeça, mais sarcasmo embalado por guitarras dançantes. Mas o que encontrei foi outra coisa.

O novo álbum do duo da Ilha de Wight não ignora o que os tornou conhecidos, mas aposta em outros caminhos. Não é um disco que chega pedindo atenção: ele se aproxima de forma mais sutil, quase desconfortável às vezes, como um sussurro ao pé do ouvido.

Rhian Teasdale e Hester Chambers parecem menos interessadas em parecer espertas e mais dispostas a se deixar atravessar pelas emoções. O humor continua lá, mas agora dividido com desejo, confusão e uma ternura inesperada. “CPR”, a faixa de abertura, já entrega essa virada. É teatral, íntima, sexy e um tanto frágil. A produção de Dan Carey se mantém, mas com um novo tipo de sujeira — menos imediata, mais espessa.

Me peguei ouvindo “Liquidize” tentando entender se era uma música sobre crise, tesão ou os dois ao mesmo tempo. Tem essa energia meio adolescente, meio existencial, em que tudo parece urgente e confuso. O quinteto, agora bem mais entrosado, soa mais seguro no caos. A presença de Ellis Durand, Henry Holmes e Joshua Mobaraki fortalece esse Wet Leg mais ruidoso, menos polido.

“Catch These Fists” me lembrou por que gostei tanto do primeiro álbum: tem raiva, tem groove, mas também não leva nada a sério demais. Já “Davina McCall”, com sua mistura de fofura pop e referências aleatórias, também me chamou muito a atenção. É engraçado como, mesmo quando se aproximam da doçura, elas não soam artificiais. Há um desconforto real ali. Uma vontade de se abrir, mas com medo do ridículo — o que torna tudo mais honesto.

“Jennifer’s Body” é onde o disco me ganhou de vez. Uma espécie de mantra distorcido, com resquícios de adolescência gótica e tensão contida. Senti como se tivesse entrado num filme estranho que já assisti em sonho. Depois vem “Mangetout”, que explode com raiva e escárnio. A frase “You wanna fuck me, I know most people do” me fez rir e arregalar os olhos ao mesmo tempo. É provocação, mas com graça — algo difícil de equilibrar.

O disco atinge um meio-termo estranho entre vulnerabilidade e deboche. “Pond Song” tem um romantismo quase nerd, tímido, como se alguém estivesse se declarando com vergonha. Em seguida, “Pillow Talk” joga tudo para o alto: é uma fantasia sexual absurda e divertida, onde o desejo é tratado como uma brincadeira — e não como algo solene.

Admito que em “Don’t Speak” e “11:21” me perdi um pouco. São faixas que tentam desacelerar, mas que não têm a mesma força das outras. Ficam num meio do caminho que soa hesitante. Também senti cansaço com o uso constante de comparações nonsense — “sou sua Davina”, “sua marshmallow worm”, “sua Shakira”. No início é engraçado, depois começa a parecer repetição.

Mas ainda assim, “Moisturizer” me deixou curioso até o fim. É um disco que não tenta se explicar. Joga camadas, ruídos, vozes, confissões desconfortáveis e espera que você entre no jogo. O Wet Leg não está tentando provar nada. Está experimentando, tropeçando, se expondo um pouco mais. E isso, para mim, torna esse segundo álbum mais interessante do que o primeiro.

Talvez porque, no meio do ruído, encontrei algo mais difícil de fingir: vulnerabilidade.

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