O mês de Dezembro trás como significado, um tempo de renovação e esperança, simbolizando o alvorecer de uma boa nova… só se foi pelo prenúncio do caos, entretanto, nesse dia 7 de Dezembro com a apresentação da lendária banda Mayhem que não vinha tanto a capital paulista como não pisava formalmente para uma apresentação no país desde Novembro de 2022.

Embora o entusiasmo, o clima era de apreensão, desde o início das vendas, especialmente depois do cancelamento das datas em solo nacional na turnê latino americana de 2023, após as polêmicas e o estardalhaço moral causados pela síndrome de cavaleiro branco de um certo deputado, cujo aqui não merece divulgação ou ser lembrado, tanto por um congresso em frangalhos, que acabaram por difamar o trabalho honesto de uma banda a nível nacional questionável.
Entretanto, é da imagem de choque que advém a divulgação, uma vez que é a primeira em que essa toca para um público muito maior no país do que em outrora, já comparando a capacidade de 1.200 pessoas no Carioca Clube (da vez anterior) com a de 3,800/4.500 da atual VIP Station. Em todas as instâncias em que o moralismo, mesmo que sob o disfarce de “progressismo”, sempre vai perder, especialmente em um meio de contra cultura que, convenhamos, nos últimos anos tem deixado a desejar quando se trata de imagem de choque e valores independentes da opinião externa.

O público foi começando a chegar em alta a partir do final da tarde, durante o horário de abertura, mesmo com alguns que estavam presentes mais cedo, com direito a um almoço espetacular no Show Dois Mil Bar uma calçada a frente, tendo no cardápio um bife criminoso de suculento capaz de alimentar até o mais miserável dos seres por uma vida inteira, compensando também, além do almoço, uma variedade de lanches que dão de 10 a 0 no cardápio da própria casa em que ocorria o evento.
Entretanto, é necessário frisar alguns problemas de última hora, e mesmo que em minha defesa da banda nos dois parágrafos acima, a falta de respeito com o público deixou a desejar a partir do momento em que a casa, uma vez programada para abertura às 18hs, estava fechada para a passagem de som, que convenhamos aqui, antes desse horário. já deveria ter acontecido, atrasando todo o cronograma da produtora e também a rotina da audiência presente para vê-los ao vivo. Com todo respeito, se você vem a um país que já teve problemas anteriormente, não é a conduta esperada quando se está tentando pintar de uma imagem positiva nesse, dois anos depois um dos piores ocorridos com seu próprio negócio.
O show, que deveria ocorrer as 20hs, acabou rolando um pouco mais tarde, e da abertura da casa as 19hs, foram 3 horas de atraso, segundo alguns presentes que mencionaram ter sido contadas no relógio. Porém, mesmo com esse perrengue, estavam todos muito ansiosos para o evento. Plenamente cheia, até onde se sabe, até antes da data, tínhamos ingressos ainda no último lote (terceiro) e no penúltimo para o mezanino. Se mais foram comprados a ponto de lotação, isso não se sabe, porém, é garantido que a produtora saiu no lucro.

Mesmo com as polêmicas, os noruegueses tem recebido um enorme prestígio nos últimos anos, desde as celebrações de aniversário tocando o De Mysteriis Dom Sathanas na íntegra, até edições especiais em box-sets de toda sua discografia, incluindo uma divulgação um tanto intransigente de uma certa adaptação de um livro um tanto mal falado na cena, no caso, o Lords Of Chaos, que conta a trajetória do Inner Circle, dessa vez, em uma dramatização digna de Sessão Da Tarde, na tentativa frustrada de mirar em uma Tela Quente. O público jovem do grupo tem crescido nos últimos anos por parte da Geração Z, tendo dedicado bastante respeito e prestígio ao seu legado. Mesma geração essa que compôs de forma mista e muito relevante os pagantes presentes no estabelecimento naquele domingo.
Um telão no palco revela um vídeo mostrando diversas fases dessa que celebra 40 anos de estrada, com direito a diversas fases ao vivo como também registros fotográficos em estúdio e até mesmo o túmulo do ex e falecido líder da banda Euronymous como parte da edição, dando entrada aos membros aos palco, e abrindo com a faixa Malum, do último álbum de estúdio lançado Daemon (2019), seguida de Bad Blood, que compõe um sistema de 2 músicas por lançamento, de trás pra frente, na primeira parte do show. É bem interessante como hoje em dia, a fase experimental é prestigiada, uma vez que na época de seus lançamentos, era constantemente comparada com o legado dos dois primeiros lançamentos de forma pejorativa e injustamente desmerecida.
Em vídeo, a cada álbum representado, mostrava uma edição caótica e muito bem editada para ocasião de cada uma dessas fases, juntamente com um palco muito bem ornamentado, além da ilustre presença de palco por parte do vocalista Atilla, que aqui, junto com o resto do grupo, parecia bem mais animado do que nas vezes anteriores que tocaram no país, sorrisos estavam presentes vez ou outra na face do frontman, algo um tanto incomum, porém não raro em apresentações do gênero, onde o público brasileiro tende ser irritantemente fechado em alguns momentos.

Muitas vezes, para se manter a teatralidade, o contato com o público deve ser mínimo e nenhum, e no caso ali, a comunicação direta era algo também presente, porém, com um entusiasmo ainda maior que incentivava a audiência, á inclusive, fazer um moshpit cavernoso vez ou outra. A mudança de figurino por parte do vocalista incrementava nessa temática, mostrando seu lado carismático de sempre, muito apesar de ser um tanto fechado fora dos palcos e também nos bastidores. Para o que vos escreve, as faixas de destaque desse primeiro ato do show foram durante as performances dos álbuns Chimera (2004), Grand Delcration of War (2000) e que celebrou recentemente seus 25 anos de lançamento, além do EP de retorno as atividades Wolf’s Lair Abyss (1997), que marcou um novo início para os remanescentes que se reerguiam da tragédia pós morte de seu líder.

Muito embora material dos álbuns Esoteric Warfare (2014) e Ordo Ad Chao (2007) tenham sido tocados, o prestígio não foi daquelas coisas, talvez por serem álbuns que sejam diferentes até demais para uma audiência não tão acostumada com essa sonoridade mais avant garde, ou por simplesmente o atraso ter pesado um pouco no ânimo dos presentes, mesmo com a visível ansiedade de estarem ali presentes. No caso do último citado, perderam a oportunidade de tocar a Anti, que fecha o disco e sendo uma das mais agressivas e diretas do álbum, algo que talvez pudesse acordar um pouco alguns mais entediados.
Entra a segunda parte, talvez, a que na memória de muitos presentes, seria o ponto, ou pelo menos um dos principais daquela apresentação, o rito de passagem e homenagem não apenas a Euronymous, mas também ao vocalista Dead, que tirou sua própria vida 3 anos antes de ver o trabalho mais prestigiado do grupo ser concebido, na qual também o guitarrista e membro fundador também não pode o ver da mesma forma por ter sua vida ceifada por Varg Vikerness, ou Count Grishnackh, como se referia anteriormente.
Cada um dos citados, além dos membros remanescentes e ex-membros tiveram suas menções imortalizadas em vídeo na introdução, que abriu desse segundo ato com o hino Freezing Moon, com o público participando de forma bem viva e entusiasmada (para um álbum que é um tanto funesto), seguido de outras clássicas como Life Eternal, a faixa título De Mysteriis Dom Sathanas e Funeral Fog, cujo um problema técnico parou a performance dessa logo de início, mostrando uma banda paciente para a solução do problema e interagindo de forma divertida com o público que clamava em êxtase “Mayhem, Mayhem, Mayhem” continuando o ar descontraído daquela celebração.

Já solucionado, essa última que fechava parte do set já veio quebrando tudo. Não apenas, cada membro já não presente mais nesse plano foi prestigiado a partir de suas fotos ora pessoais como para imprensa na época, como também itens pessoais do falecido ex-vocalista estavam presentes como ornamentos no palco. Todos, dessa vez sem exceção apenas de Atilla, vieram tocar parte desse catálogo trajados de roupões escuros que cobriam os seus rostos, como é de costume a cada show da banda em que “De Mysteriis” compõe parte do setlist. A banda sai do palco, dando espaço para o grande finale….
As luzes da casa ascendem, “ué, será que acabou”? Mesmo na esperança de um encore, sabemos que em eventos desse tipo, as famosas pregações de peça por parte do destino são bem frequentes quando se trata de pararem um evento pela metade, até pelo fato do atraso ter contado como um fator. Felizmente, a recíproca de quem acreditou na graça do encore era verdadeira, e Necrobutcher, de volta ao seus trajes casuais, aparece com mais doses de serotonina nunca vistas no palco, apresentando a gangue das antigas, Manheim e Messiah, que gravaram nada mais e nada menos do que o primeiro EP do grupo no ano de 1987, o mesmo em que uma outra grande banda influente em nossas terras também lançaria seu primeiro debut, I.N.R.I., da banda Sarcófago, outra lendária do selo Cogumelo Records.
A vinda desses já havia sido anunciada poucos meses atrás, trazendo uma camada extra na celebração, entretanto, fica aqui um questionamento que não apenas eu, como outros também aqui fizeram, da falta de Maniac como parte desses convidados especiais ou até mesmo do ex-guitarrista Blasphemer, mesmo após terem acertado seus desentendimentos depois de muitos anos. Essa terceira e última parte compôs o EP Deathcrush na íntegra, com uma performance explosiva por parte dos ex-integrantes, Necro e também de Teloch e Ghul, que compõe a formação atual e estável de muitos anos do grupo.

A destruição e o prenúncio do caos se encerram da melhor forma possível e os membros se despendem na frente do palco mostrando alegria e entusiasmo de terem tocado mais uma vez em terras brasileiras, onde a volta era incerta até um certo tempo atrás. E agora que estão lançando para Fevereiro o álbum Liturgy Of Death, que uma próxima turnê de divulgação no país não seja atrapalhada por políticos puritanos, que outras cidades, como Porto Alegre, cuja a banda sempre foi presente até essa palhaçada acontecer, além de um certo estabelecimento, cuja falta de “opinião” embasada na realidade se deu por trair a confiança dessa, Brasília, Belo Horizonte e o Rio De Janeiro voltem a ser parte desse itinerário, assim como Limeira que vem recebendo shows do gênero com uma procura ainda maior recentemente.
‘When it’s cold, and when it’s dark..The moon can obsess you!
The dark of the Freezing Moon!’
– Per Yngve Ohlin (1969-1991)



