A onda de revival que assolou o mundo de uns anos pra cá trouxe o retorno de muitas bandas que se tornaram muito maiores do que elas realmente eram quando tiveram seu apogeu nos anos 90 ou início dos anos 2000. Este é um fenômeno que a internet nos proporciona. Gostaria de trazer uma resposta explicando toda esta catarse acerca de bandas que nem eram tão grandes assim e que se tornaram muito maiores nos dias atuais.
Tenho um ensaio de uma tese — não acho que ela seja definitiva, e torço para que não seja, na verdade. A cultura pop virou um eterno looping de artistas repaginados e montados apenas pra trazer nostalgia pra quem os consome — e aqui uso a palavra “consome” me valendo da gênese dela. A música mainstream virou um produto que se consome até ele ficar obsoleto em um prazo curtíssimo de tempo. No espaço de uma semana, outro conteúdo inútil e infantilóide irá tomar conta da sua linha do tempo, e você vai ouvir a mesma música ininterruptamente dentro da sua casa, dentro do ônibus, dentro do metrô, no seu trabalho, no retorno pra casa — e tudo isso de novo no dia seguinte, e no dia seguinte ao dia seguinte.
Hoje, o mais curioso disso tudo, na maioria das vezes não sabemos quem é o cantor, e conhecemos apenas 15 segundos da música do momento. Atualmente, a publicidade e o algoritmo decidiram golpear muito baixo, utilizando a tática da nostalgia e do apelo emocional pra vender qualquer porcaria da qual não precisamos — de tônicos capilares que prometem o fim da calvície a fórmulas mágicas contra disfunção erétil. Quantas vezes quase caímos na armadilha de achar que não existe mais música de qualidade quando ouvimos “The Bad Touch” ou “Barbie Girl” na fila de qualquer farmácia?
Bandas dos anos 90 estão voltando com tudo. O sucesso de Smashing Pumpkins entre os jovens hoje na internet é um fenômeno avassalador. Não posso torcer o nariz e achar isso ruim. Em meio a tanta porcaria descartável fazendo sucesso e tocando em todo lugar entre os jovens, problematizar a popularização de bandas incríveis sendo conhecidas por gerações atuais seria contraditório da minha parte.
Espero que, cada vez mais, a nova geração conheça não somente bandas dos noventa, mas também de décadas anteriores — e que continuem fazendo suas próprias bandas e usando toda essa referência.
Dito isso, quero falar um pouco de como foi o show do Oasis no último dia 7/11 aqui em Sidney, na Austrália.
Depois do anúncio do término da banda em 2009, conflitos e trocas de farpas em entrevistas ou via Twitter (atualmente X) viraram rotina entre Liam e Noel Gallagher, afastando cada vez mais a esperança dos fãs para um possível e improvável retorno.
Aproveitando a sabedoria e maturidade de quem já passou dos 50 anos de idade, e vendo a popularidade da banda alavancar de forma orgânica na internet — e tendo o apelo dos fãs antigos e da nova geração como principal motivação para um possível retorno — Liam Gallagher começava a dar indícios de um desejo de reaproximação do irmão mais velho.
Isso, consequentemente, deixava os fãs cada vez mais animados e ansiosos, apesar de desacreditarem que tudo isso seria possível, se tratando de dois dos maiores egos que o rock ‘n’ roll já viu.
Rumores indicam que o grande estopim para o retorno aos palcos seja o divórcio milionário de Noel, cuja quantia passaria de 20 milhões de libras — e temos que concordar que se trata de um motivo pra lá de justificável.

O desejo de retorno por parte de Liam e o divórcio de Noel foram o terreno fértil para um possível reencontro, e o elo que liga isso tudo foi o guitarrista e membro fundador da banda Paul “Bonehead” Arthurs — o qual merece seu lugar de destaque na história da humanidade e ser considerado um verdadeiro pacificador.
Desde o anúncio da turnê Live ’25, a expectativa vinha crescendo como uma onda. Opiniões dividiam os fãs — muitos deles, embora esperançosos, temiam qualquer conflito durante a tour e um inesperado rompimento novamente em meio aos intervalos das apresentações. Mas, quando o logo preto e branco do Oasis iluminou os telões do Accor Stadium, o impossível se tornou real.
Fãs de todas as idades — de veteranos do britpop a adolescentes que conheceram a banda pela internet — se uniram em um mesmo ritual: celebrar a volta de uma das maiores bandas da história do rock, e certamente a maior banda dos anos 90.
A abertura ficou por conta da banda australiana Ball Park Music, que aqueceu o público com entusiasmo. Mas a verdadeira erupção começou assim que Liam Gallagher surgiu no palco, com sua clássica postura — irônico, provocador, com o humor ácido típico britânico e o olhar desafiador. Noel Gallagher o acompanhou com seu habitual ar sereno, como quem sabe exatamente o peso das notas que vai tocar.
Os irmãos Gallagher, embora contidos, interagiram diversas vezes com o público, fazendo piadas de si mesmos, celebrando um estádio lotado e demonstrando gratidão e paixão pelo momento que estavam vivendo ao ver tantas pessoas cantando, tão emocionadas e a plenos pulmões, canções que atravessaram décadas até tocar novos fãs e novas gerações de jovens que nem eram nascidos no auge da banda.
Quem estava lá pôde perceber que o setlist foi feito com carinho, homenageando os fãs antigos. Quase todos os maiores clássicos foram tocados, com exceção de “Don’t Go Away” e “All Around the World”. No entanto, o setlist vem sendo rigorosamente fiel em todos os países por onde a banda está passando, sem adicionar nem retirar nenhuma música — inclusive terminando com “Whatever”, que encerra com o trecho de “Octopus’s Garden”, dos Beatles, momento que já se tornou um clássico da banda desde os anos 90. Foi uma viagem por todas as fases do Oasis, da arrogância juvenil ao lirismo melancólico.
Clássicos como “Rock ’n’ Roll Star”, “Morning Glory”, “Wonderwall” e “Live Forever” incendiaram o estádio. Em “Don’t Look Back in Anger”, Noel deixou o público cantar sozinho e, por alguns minutos, as 70 mil vozes soaram como uma só — um dos momentos mais emocionantes da noite de 7 de novembro de 2025.
Também houve espaço para surpresas: “Half the World Away” e “Slide Away” — esta última, uma das músicas mais cruas da banda e queridinha dos fãs mais saudosos, definitivamente a minha preferida — despertaram lágrimas e abraços entre gerações. Era como se cada música abrisse uma janela para uma época, um sentimento, um pedaço da vida de quem estava ali.
A produção do show foi impecável. Telões de alta definição, iluminação dinâmica e uma mixagem que fez cada acorde ecoar como um trovão. O público australiano respondeu à altura — cantando, dançando e transformando o estádio em uma celebração coletiva.
Mesmo com relatos pontuais de falhas de som em setores mais distantes no início do show — nas três primeiras músicas, a voz de Liam estava encoberta pela altura das guitarras —, tudo foi prontamente ajustado após um gesto contido e educado de Liam, que tocou o microfone e, em seguida, apontou para cima, como quem pedia um pouco mais de potência em suas melodias rasgadas.
Mas ninguém parecia disposto a reclamar de nada. Afinal, quem ousaria achar algum defeito em um momento tão mágico como esse? O Oasis estava diante de nós — e o sonho havia se tornado realidade.
Ver Liam e Noel dividindo o palco não foi apenas um reencontro musical — foi uma redenção para todos que aguardavam este momento. Depois de tantos anos de brigas, distanciamentos e palavras afiadas, o simples fato de estarem lado a lado já dizia tudo. Não precisaram de discursos grandiosos,nem de grandes gestos, embora os abraços ao início e fim da apresentação siginifique muito para quem conhece a trajetória conturbada dos irmãos Gallagher, bastou a música para preencher o espaço entre eles. O público entendeu o significado daquele momento sem que uma única palavra fosse dita.
A cada refrão, ficava evidente que o Oasis é muito mais do que uma banda. É um sentimento compartilhado, uma memória viva, uma força capaz de unir gerações que aprenderam a sonhar alto, desafinar juntos e cantar como se o mundo dependesse disso.
Com as duas noites em Sydney, o Oasis não apenas revisitou o passado — reafirmou o seu lugar na história. Mais do que um revival, o que se viu foi a transformação da nostalgia em celebração, do tempo em emoção presente.
Em uma era de hits descartáveis e memórias curtas, assistir a 70 mil pessoas cantando “Don’t Look Back in Anger” em uníssono foi um lembrete poderoso: algumas músicas são eternas, e algumas bandas simplesmente não sabem envelhecer.
O Oasis está de volta. E, por duas noites mágicas em Sydney, o tempo parou — o mundo voltou a cantar, e tudo pareceu possível outra vez.
A próxima parada será a América Latina, a banda ainda passará por Argentina, Chile e encerra a tour em São Paulo com duas datas, 22 e 23 de Novembro.
Dedico este texto ao grande e querido Júlio Reny, mandamos muito amor pra família e torcemos por sua plena recuperação.
Veja as fotos abaixo feitas pelo colaborador Luiz Afonso
































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