A melodia no topo: Roberto Carlos e a aventura que subiu aos céus de São Paulo

Luis Fernando Brod
5 minutos de leitura
Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura. Foto: Cena do Filme.

No final dos anos sessenta, o Brasil vivia uma efervescência cultural que encontrava em Roberto Carlos um de seus maiores expoentes. O cantor, já consolidado como o rei da Jovem Guarda, buscava expandir seus horizontes artísticos, e o cinema se apresentou como um caminho natural para essa evolução. Foi nesse contexto que surgiu “Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura”, um filme que não apenas acompanhava o sucesso do álbum homônimo, mas o elevava a uma nova dimensão visual e narrativa.

O disco “Em Ritmo de Aventura”, lançado em 1967, representou um ponto de virada na carreira de Roberto Carlos. Nele, o artista começou a transitar de um rock mais puro da Jovem Guarda para uma sonoridade mais pop e romântica, que viria a caracterizar grande parte de sua obra posterior. Canções como “Eu Sou Terrível”, “Quando” e “Como É Grande o Meu Amor Por Você” se tornaram clássicos instantâneos, mostrando a versatilidade do cantor e sua capacidade de dialogar com diferentes públicos. A gravação do álbum foi um processo meticuloso, com arranjos que mesclavam a energia do rock com a sofisticação da orquestração, um trabalho que contou com a colaboração de maestros e músicos de estúdio que ajudaram a moldar o som que definiria uma era.

O sucesso do álbum abriu as portas para o filme, dirigido por Roberto Farias, que tinha a ambição de criar uma obra cinematográfica que fosse tão moderna e arrojada quanto a música de Roberto Carlos. Farias queria que o filme capturasse a energia do cantor e a atmosfera de um Brasil em transformação. A ideia de levar a banda para tocar em um local inusitado, que rompesse com os palcos tradicionais, era parte dessa visão. A cena do terraço, em particular, foi concebida para ser um momento de grande impacto visual, uma declaração de liberdade e de vanguarda.

A escolha do Edifício Galeria Califórnia, um dos marcos arquitetônicos de São Paulo, não foi aleatória. Sua localização central e a vista panorâmica da cidade ofereciam o cenário ideal para a grandiosidade que se desejava. A logística para levar os equipamentos e a banda para o topo do prédio foi complexa, exigindo coordenação e permissões especiais. A ideia de realizar uma performance em um local tão público e inesperado partiu da equipe de produção do filme, liderada por Roberto Farias, que buscava inovar e criar imagens que ficassem gravadas na memória do público. A cena, com Roberto Carlos e sua banda tocando para uma multidão que se aglomerava nas ruas e janelas dos prédios vizinhos, tornou-se um dos momentos mais memoráveis do filme.

Curiosamente, essa cena de Roberto Carlos no terraço, filmada em 1968, precede em alguns meses o famoso show dos Beatles no telhado da Apple Corps, em Londres, ocorrido em janeiro de 1969. Embora seja improvável que houvesse uma influência direta do filme brasileiro sobre a banda inglesa, é possível traçar um paralelo entre as duas iniciativas. Ambas as performances representam um espírito da época, uma busca por quebrar as barreiras dos palcos convencionais e levar a música diretamente ao público, em um gesto de espontaneidade e conexão urbana. A ideia de usar o espaço público, e especificamente os telhados, como palco para a música, era uma manifestação de uma tendência global de experimentação e de uma nova forma de interação entre artistas e audiência.

O filme “Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura” e o álbum que o inspirou foram cruciais para solidificar a imagem de Roberto Carlos como um artista completo, capaz de transitar entre a música e o cinema com igual maestria. A cena do terraço, em particular, permanece como um símbolo da ousadia e da capacidade de inovação que marcaram aquele período da cultura brasileira, um registro visual da melodia que subiu aos céus de São Paulo e se espalhou por todo o país.

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