No verão de 1990, Kurt Cobain sentou-se em um estúdio de Seattle, rabiscando letras em um pedaço de papel. O Nirvana havia lançado seu álbum de estreia, Bleach, no ano anterior, uma coleção crua de sludge e feedback que capturava o ventre úmido do som do noroeste do Pacífico. Mas Cobain tinha outras ideias fervilhando na cabeça.
Ele mirava em algo mais leve, mais contagiante – uma canção pop que pudesse se infiltrar nos ouvidos sem o habitual ruído. Esse experimento se tornou “Sliver”, uma faixa que, em sua simplicidade, sugeria o poder melódico que o Nirvana liberaria no mundo apenas um ano depois.
A banda estava em transição naquela época. Chad Channing havia saído da bateria, deixando Cobain e o baixista Krist Novoselic para buscar substitutos. Eles encontraram Dan Peters, do Mudhoney, um ato fellow de Seattle que navegava pelo mesmo circuito da Sub Pop. Peters se encaixou perfeitamente, seus batidas firmes se travando com o ronco de Novoselic e os riffs irregulares de Cobain. “A química definitivamente estava lá”, Cobain diria mais tarde a Michael Azerrad em Come As You Are, com um tom de o-que-poderia-ter-sido. Eles poderiam ter construído algo duradouro, mas o destino os puxou para Dave Grohl em breve.
A gravação aconteceu rápido, quase por acidente. O Nirvana se espremeu no Reciprocal Recording de Jack Endino enquanto os amigos do Tad faziam uma pausa para o almoço. Endino, que comandara Bleach, capturou a sessão em poucas horas. Nada de setups sofisticados, apenas amplificadores zumbindo no canto da sala. Cobain alegou que as letras saíram bem antes da fita rolar – um menino levado para a casa dos avós, implorando à avó para ligar para a mãe, só para cochilar em frente à televisão e acordar nos braços familiares. Uma demo acústica do box set de 2004 With The Lights Out mostra que os ossos da canção estavam lá antes, mas a mentira adicionava ao mito da espontaneidade.
Era tirada da infância de Cobain? Ele vacilou sobre isso, primeiro acenando para um medo vago de visitas aos avós, depois recuando. Sua irmã Kim esclareceu o ar em Heavier Than Heaven, de Charles R. Cross: era só um garoto sentindo falta da mãe, evitando a rotina de babá. As palavras caem planas na página, sem camadas de angústia ou metáfora. “Avó, me leva pra casa / Quero ficar sozinho”, canta Cobain naquele meio-gemizido, meio-canto. É a dor cotidiana da separação, posta em um riff que salta como uma criança em um trampolim.
Essa franqueza separava “Sliver” do catálogo inicial do Nirvana. Bleach rosnava com histórias de alvejante e insetos, mas aqui Cobain despojara, perseguindo ganchos que grudavam. Ele chamou de experimento, uma guinada deliberada para o pop sem o polimento. Influenciado pela esperteza pop que o R.E.M. e o Beat Happening infundiam em sua música sem perder a essência alternativa, ele misturou borda alternativa com apelo de earworm. “Decidi que queria escrever a música pop mais ridícula que já tinha escrito”, ele disse a Azerrad. Era um balão de ensaio para o próximo disco, uma forma de cutucar os ouvintes em direção à melodia no meio do barulho.
O título em si carregava uma torção. Cobain escolheu “Sliver” esperando que as pessoas o confundissem com “Silver”, uma cutucada quieta nas expectativas. Ele se preocupava que parecesse exposto demais, literal demais comparado à dor velada nas canções vindouras. No entanto, essa ingenuidade alimentava seu poder. “Tem uma ingenuidade enorme”, ele disse. “Foi feito tão rápido e cru e perfeito que acho que não conseguiríamos capturar isso de novo se decidíssemos regravá-lo.” A faixa dura menos de três minutos, bateria batendo simples, guitarra chugando adiante, a voz de Cobain rachando o suficiente para soar real.
Era Seattle em 1990, uma cidade zumbindo com energia underground. A Sub Pop produzia fitas cassete e sete polegadas, alimentando uma cena que misturava fúria punk com peso metal. O álbum de almoço do Tad não era exceção – cru e pesado, como o ar naqueles estúdios. O Nirvana, ainda companheiros de selo, pegou o espaço e o clima, transformando um projeto lateral em uma declaração. “Sliver” caiu como o B-side de “Dive” nos EUA em outubro, depois chegou ao Reino Unido em janeiro de 1991, bem na hora em que a turnê começava. Pegou play em rádios em bolsos, um teaser para a tempestade se formando.
Quando Nevermind saiu em setembro de 1991, “Sliver” havia feito seu trabalho quieto. Faixas como “Smells Like Teen Spirit” e “Come As You Are” ecoavam seu blueprint: versos que constroem tensão, refrões que explodem em cantos coletivos. O arrependimento de Cobain pela fama mainstream veio depois, mas em 1990, ele abraçou a mudança. O álbum vendeu milhões, catapultando o Nirvana de bares de mergulho para arenas. “Sliver” ressurgiu em Incesticide em 1993, aninhado entre B-sides e outtakes, um lembrete de raízes no meio do caos.
Olhando para trás, “Sliver” captura uma banda no limiar. Cobain testava águas, misturando seu ceticismo punk com o puxão do pop. A explosão grunge devia muito a essa alquimia – emoção crua embrulhada em melodias acessíveis. As batidas de Peters a impulsionaram para casa, uma formação fugaz que acendeu ouro. O Nirvana não perseguiria tal simplicidade de novo, mas a lição perdurou: às vezes as melhores canções chegam sem aviso, como um garoto acordando de um cochilo nos braços da mãe.




