de início, mas não tem nada a ver com futebol: é uma afirmação de identidade, uma maneira de trazer a ancestralidade afro para o centro da conversa e de provocar quem espera algo convencional. Eles não querem ser uma “banda de rock” no sentido tradicional. Na verdade, rejeitam esse rótulo. Buscam algo que nasça da periferia, do improviso, da sensação de urgência, da crueza como estética — um som que mistura punk, math rock, no wave, jazz experimental e elementos afro de forma instintiva, tensa, quase sempre suja, mas honesta.
A própria noção de “afroexperimentalismo turvo”, que eles usam para se descrever, ajuda a entender: não é música para agradar, é para existir. O “turvo” não se refere só ao timbre saturado, mas ao sentimento de quem cresceu entre contrastes, ruídos, tensões sociais e políticas. O som acompanha isso. É imprevisível, irregular, vivo. Não tem polimento, porque esse rigor técnico lhes soa artificial. O que eles querem é expressar um lugar, um corpo, uma experiência.
Dentro dessa proposta, o lançamento Entre Quatro Paredes funciona quase como um manifesto. É um disco que parece gravado olhando nos olhos de quem escuta, num ambiente fechado, quase sufocante — mas carregado de energia. A sensação é de acompanhar o trio ao vivo, sem pensar em acertos ou erros, apenas na intensidade. É uma obra dura, mas curiosamente libertadora para quem está cansado de ouvir sempre as mesmas fórmulas.
Algumas faixas ajudam a sentir esse espírito logo de cara. “Lurdes” é uma pancada: começa arrastada e logo entra numa espiral de guitarras saturadas e vocais que soam mais como desabafos do que como letras. “Preto Mídia” mantém a agressividade, num clima de crítica atravessada por frustração, repetição e ruído — parece uma conversa travada com a sociedade inteira. “Nerds/Punks” é quase um rito, longa, fragmentada, provocadora, mexe com rótulos e identidades como se estivesse desmontando tudo diante da gente. Já faixas como “18h52” e “NOU”, que circulam no repertório recente do grupo, reforçam esse espírito exploratório, como se estivessem testando o limite do que ainda pode ser chamado de música dentro de sua estética.
Entre Quatro Paredes não é um disco “fácil” — e nem tenta ser. Mas justamente por isso é interessante. A Nigéria Futebol Clube faz parte de um pequeno grupo de artistas que estão dispostos a tirar o ouvinte do conforto e lembrá-lo de que a música pode, sim, ser um choque. E, sinceramente, acho que faz falta esse tipo de choque. Se você gosta de descobrir bandas que não se encaixam em moldes, que preferem a verdade ao acabamento, vale muito mergulhar nesse disco. Coloque o fone, aumente o volume e deixe a banda te arrastar para dentro dessas quatro paredes — pode ser uma experiência intensa, mas é daquelas que ficam.



