Quando foi lançado, em fevereiro de 1995, “It’s Five O’Clock Somewhere” chegou com o peso de duas expectativas. De um lado, a curiosidade em torno do primeiro projeto paralelo de Slash fora do Guns N’ Roses. De outro, o desejo de parte dos fãs por um sucessor direto de “Use Your Illusion”. Nenhuma dessas promessas se cumpriria completamente, o que, paradoxalmente, define o tom do disco.
Gravado entre 1994 e o início de 1995, o álbum surgiu durante um período de desgaste interno no Guns N’ Roses. A banda já dava sinais de estagnação criativa, e Axl Rose não parecia disposto a trabalhar em grupo. Segundo o próprio Slash declarou à Guitar World, boa parte do material de “It’s Five O’Clock Somewhere” foi inicialmente composto com o Guns em mente. Diante da inércia, ele decidiu seguir por conta própria, ao lado de Matt Sorum e Gilby Clarke, recrutando o baixista Mike Inez (Alice in Chains) e o vocalista Eric Dover (Jellyfish).
“No primeiro disco do Snakepit, usei algumas ideias que já estavam planejadas para o próximo disco do GN’R”, explicou ele à revista Rock Hard. “Mas Axl e eu discordávamos sobre a direção futura da banda. Toquei uma demo para o Axl com algumas das minhas ideias para músicas e tudo o que ele disse foi: ‘Não estou a fim de tocar esse tipo de música’. Respondi: ‘Mas este poderia ser um excelente disco dos Gunners, cem por cento no estilo do GN’R’. Ele não se importou muito, porque só queria tocar uma porcaria industrial e com sonoridade de Pearl Jam.”
“O que as pessoas não sabem é que o álbum Snakepit é o álbum do Guns N’ Roses”, disse o próprio Rose em uma entrevista de 1999 com Kurt Loder, da MTV, quando questionado sobre a situação de um novo álbum do Guns N’ Roses. “Eu simplesmente não faria isso… Eu não acreditava. Achei que havia riffs, partes e algumas ideias que precisavam ser desenvolvidas.” Numa crítica maliciosa ao que ele aparentemente considerou a qualidade abaixo da média do álbum, Rose concluiu: “Acho que concordo com o público nessa questão.”
Rose obviamente havia optado por ignorar o fato de que “It’s Five O’Clock Somewhere” havia vendido mais de um milhão de cópias e que sua mistura de grooves de rock e riffs pesados teria sido um ótimo próximo passo para o GN’R. Talvez o vocalista tivesse captado alguns dos temas das letras do álbum e o fato de que muitas dessas músicas eram sobre os problemas de Slash com uma cantora problemática.
“Todas as minhas músicas são direcionadas a uma pessoa, embora ninguém tenha percebido isso na época”, escreveu Slash em sua autobiografia. “Usei aquele disco como uma oportunidade para desabafar um monte de merda que eu precisava desabafar.”
O disco tem uma atmosfera de jam session capturada em fita. As faixas são cruas, quase desleixadas, o que parece proposital. Nada foi feito para agradar o mercado. O que ouvimos é basicamente uma extensão natural dos ensaios da banda.
A abertura com “Neither Can I” já deixa claro o clima do disco: riffs pesados, levada arrastada e um vocal que aposta mais na atitude do que na técnica. Eric Dover canta com uma mistura de desdém e agressividade que lembra vocalistas de bandas setentistas como Humble Pie ou Bad Company. Ele não tenta soar moderno — e isso joga a favor do álbum.
Em “Dime Store Rock” e “Beggars & Hangers-On”, o disco atinge seus momentos mais fortes. Ambas são canções com estruturas mais bem definidas e refrões pegajosos, mostrando como Slash consegue canalizar sua veia melódica mesmo num formato menos polido. Os solos, como sempre, vêm com assinatura própria: melódicos, sujos e cheios de nuances que se afastam do virtuosismo técnico pelo qual muitos guitarristas dos anos 1990 optaram.
Já faixas como “Be the Ball” e “Monkey Chow” soam quase como exercícios de estúdio, com groove acentuado e estrutura livre. A produção, assinada por Mike Clink (o mesmo dos álbuns clássicos do Guns), preserva as imperfeições da gravação, em vez de escondê-las. Em certos momentos, isso resulta numa sonoridade um tanto embolada, especialmente nas faixas mais longas. Mas essa escolha estilística reforça o caráter despretensioso do disco.
Um disco de hard rock à moda antiga, lançado fora de hora
A essa altura dos anos 1990, o hard rock de raiz estava em desvantagem comercial. O grunge havia dominado as paradas, e o público buscava autenticidade com roupagem introspectiva. Nesse contexto, “It’s Five O’Clock Somewhere” soa anacrônico. É um disco que teria se encaixado melhor entre 1989 e 1991, antes da mudança de clima musical na indústria.
Ainda assim, sua proposta é clara. Não se trata de competir com o Guns N’ Roses nem de replicar a grandiosidade dos Illusion. É um disco de bar, com alma de ensaio e cheiro de cerveja morna. O título do álbum, uma expressão usada para justificar um drink fora de hora, funciona quase como manifesto estético da banda.
Vale lembrar que Eric Dover foi dispensado pouco tempo após a turnê do álbum, o que impediu qualquer continuidade. A formação original do Slash’s Snakepit não duraria, mas o projeto seria retomado anos depois, com nova banda e sonoridade mais polida em “Ain’t Life Grand” (2000).
“It’s Five O’Clock Somewhere” pode não ser o melhor disco que Slash já fez fora do Guns, mas talvez seja o mais espontâneo. Ele traduz, em seus excessos e acertos, o momento de transição que o guitarrista vivia. A urgência em criar algo fora da burocracia da banda principal é sentida em cada faixa.
É um álbum feito para ser ouvido sem grandes expectativas, como quem entra num boteco no fim da tarde e topa com uma banda tocando alto no canto da sala. Ali, entre o improviso e a falta de cerimônia, mora sua maior virtude.
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