fbpx

The Jesus and Mary Chain em Sydney: 4 décadas da tristeza que tanto amamos

A década de 80 é marcada pela quantidade de bandas incríveis de sonoridade ímpar e de uma estética visual e sonora inconfundível, principalmente pelo pós-punk e pelo new wave, exatamente em 1985 o The Jesus and Mary Chain trouxeram o melancólico e barulhento “Psychocandy”, uma verdadeira obra prima, e sem dúvida um dos principais álbuns de inspiração para o que, alguns anos depois, conheceríamos como Shoegaze.

A banda consegue soar pop, melancólica e caótica ao mesmo tempo, sem perder a nítida essência do pós-punk e da sua visível influência de gêneros mais simples e retos como o punk, por exemplo, ou o rock dos anos 60, tudo isso muito bem conduzido por guitarras carregadas de distorção, reverbs e vocais arrastados e tristes.

Foto: The Jesus and Mary Chain ao vivo em Sydney. Crédito: Afonso Scherer

Os irmãos Reid não são lá figuras muito conhecidas por seu carisma e simpatia, os caras empilham uma séria de opiniões controversas e brigas até mesmo entre eles ao longo da carreira – vide a faixa “Jamcod”, presente no último álbum de estúdio dos caras – é bem verdade que o tempo passa para todo mundo, e a idade acaba trazendo uma série de sentidos diferente para a vida de artistas tão “excêntricos” e famosos por seu humor ácido ou até mesmo a falta dele.

O Show de Sydney no último dia 01 de agosto, trouxe a celebração dos 40 anos de banda e junto a turnê de lançamento de seu último trabalho, “Glasgow Eyes” lançado ainda este ano pelos caras. Com uma sonoridade muito mais voltada para os sintetizadores e não mais tanto para os pedais, o álbum não é tão melancólico e sombrio carregado de texturas como a fase anos 80 da banda, lá nos seus primórdios, carregados de angústia e brutalidade sentimental, é uma obra de conciliação entre eles mesmos e seu público, desde seu retorno lá em 2007 a dupla resolveu aparar suas arestas e conflitos nos últimos anos e voltar aos trabalhos, trazendo desde então, “Damage and Joy” de 2017 e agora em 2024 “Glasgow Eyes”.

Para um teatro completamente lotado, os irmãos Reid trouxeram junto com seu “Boa Noite” protocolar quase que desejando o contrário do pronunciado, uma sequência ininterrupta de hits e clássicos da banda e um setlist com aproximadamente 17 faixas, com uma música nova aqui e outra ali e uma banda sensacional com a presença mais do que ilustre da baixista Simone Butler, do Primal Scream tal qual Robert Gillespie fora lá nos anos 80 gravando as baterias no Psychocandy. Foi definitivamente um show para presentear seu público, embora os caras sejam muito melhores tocando do que tentando ser simpáticos e protocolares.

O Show é justamente iniciado com a recente e animada “Jamcod” quase que propositalmente afim de mostrar que está tudo bem, e que os almoços de domingo da família Reid estão completos agora, seguida pela clássica “Head On” do álbum, Automatic (sim, o álbum da estrela) e seguido por outra mais clássica ainda “Happy when it Rains”, uma música agitadamente triste e um dos maiores hits da banda que levou, obviamente, o público ao mais instantâneo estado de êxtase.

Por falar em êxtase, obviamente o ponto máximo do show (de tristeza, é claro) ficou para o final quando a banda toca em sequência as baladas soturnas “Darklands” e “Just Like Honey”, encerrando o show preparado para os fãs de forma muito honesta. A banda consegue ainda hoje mesclar vigor de músicos novos com a experiência de artistas mais rodados e que sabem o lugar que estão ocupando. O que faltou de carisma para os caras sobrou em competência e profissionalismo, até mesmo quando ao iniciar “Venal Joy”, William acaba errando os primeiros acordes e pede pra começar tudo de novo, Jim então vai ao microfone e pede desculpas e brinca dizendo estarem “começando nisto”.

Mais uma vez, como volta e meia acabo lembrando, vale destacar a quantidade de adolescentes no show, cantando as músicas como quem vivera à época em que foram lançadas. Isto é um espantoso e positivo fenômeno que cada vez mais reparo aos shows de bandas que já estão atravessando duas ou três gerações, a renovação do público de Rock. E falo aqui de público mesmo, ouvinte, expectador e fã, não de consumidores de Rock, estes estão nos grandes festivais com camisetas de bandas meticulosamente desbotadas compradas naquela loja que tem todos os estilos e fazendo o sinal de diabinho com os dedos. Mas isso é uma queixa para outro dia, por ora prefiro ficar apenas com o azedume dos irmãos Reid e o incrível mistério da banda em que as barrigas caem mas os narizes continuam empinados.

Mais algumas imagens do show do The Jesus and Mary Chain em Sydney

Autor

    Deixe um comentário

    O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *